Em crise financeira, a Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) atrasou ainda mais o salário de funcionários e professores nas últimas seis semanas, no Rio Grande do Sul. O vencimento de setembro, que deveria ter sido repassado em outubro, terminou de ser pago somente neste mês e foi dividido em cinco parcelas. O drama é ainda maior: sem dinheiro suficiente em caixa, a instituição admite não ter previsões sobre quando irá ter capacidade para pagar os vencimentos integrais.
O G1 teve acesso a extratos de funcionários mostrando que a universidade pagou menos de 10% do total do salário referente ao mês de outubro em um depósito efetuado na semana passada. “Há alguns dias, meu marido ganhou R$ 40 em um espaço de uma semana. O pior é que não sabemos qual será o valor de cada parcela. Como saber se poderemos pagar as contas em dia?”, desabafou a dona de casa Catia Moraes, que preferiu não divulgar o nome do marido, funcionário no Campus de Canoas, na Região Metropolitana de Porto Alegre.
A intensificação da crise foi antecedida por uma decisão da Justiça do Trabalho, baseada em uma ação impetrada pelo Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul (Sinpro-RS) com o apoio da Reitoria, que bloqueou as contas da Ulbra. Após a intervenção, a universidade passou a ser obrigada a destinar o dinheiro em caixa prioritariamente aos funcionários e ao corpo docente. Porém, como a instituição tem dívidas com fornecedores, não há recursos para pagar em dia ou em parcela única.
A Ulbra, que garante estar determinada a solucionar as dificuldades com a liberação de crédito bancário, confirmou a piora na incidência de atrasos. No dia 9, a universidade realizou o vestibular de verão, o que traz otimismo à reitoria. “Tivemos acréscimo de 15% nas inscrições em relação ao ano passado. O momento vai melhorar com o ingresso de novos alunos”, relativizou o pró-reitor de Planejamento e Administração, Romeu Forneck.
Cofres vazios
regularizar situação (Foto: Reprodução/TV Globo)
De acordo com Forneck, a decisão da Justiça do Trabalho foi apoiado pela Ulbra porque anula outros bloqueios judiciais que favoreciam fornecedores, e prejudicavam ainda mais o repasse dos salários.
“Chegamos a ter um bloqueio mensal de R$ 17 milhões cobrados por fornecedores, enquanto a folha de pagamento mensal é de R$ 12 milhões. Ou seja, o que estava inviável, passou a ser possível”, avaliou. O pró-reitor, porém, admite não saber prever em quantas vezes o salário de outubro será pago. “Nossa meta é que cada parcela nao seja inferior a 10% do total.”
Durante o primeiro semestre deste ano, a Ulbra chegou a pagar em dia, mas em duas parcelas, respeitando um acordo selado no final de 2012 pela Justiça. Em agosto, a decisão passou a ser descumprida e começaram os atrasos, o que provocou no uma paralisação de 24 horas. A situação neste mês, no entanto, é considerada pior.
“A reitoria alegou que este é o período quando há historicamente inadimplência. Mas os professores continuam empenhados.Todos sabem que a crise ocorre há muito tempo, mas a compreensão de que para a superação da crise é necessário o funcionamento dela. A Ulbra seguira os débitos se ela continuar funcionando”, minimizou o diretor do Sinpro-RS, Marcos Fuhr.
Investigações na Ulbra
Segundo a Polícia Federal (PF), a crise na Ulbra tem origem em fraudes apuradas pela Operação Kollector em 2010. Na ocasião, 11 pessoas foram investigadas, entre elas, o ex-reitor Ruben Eugen Becker. Por decisão da Comunidade Luterana Evangélica (Celsp), Becker foi afastado do comando da universidade. A crise também provocou o fechamento de hospitais que eram mantidos pela Ulbra e elevou a dificuldade do Sistema Único de Saúde em absorver a demanda de pacientes na Região Metropolitana.
O inquérito identificou crimes de estelionato, fraude, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. A verba desviada da universidade passaria de R$ 63 milhões. A gestão de Becker é criticada pela atual Reitoria, que ainda espera receber de volta, via Justiça, parte dos valores fraudados.
Procurado pelo G1, o advogado do ex-reitor, Geraldo Oliveira, rebate qualquer relação de Becker com o desvio de valores. "Meu cliente é inocente. Passaram-se quatro anos e meio de investigações, foram à Europa, a países da América do Sul e nada foi localizado. Instituições republicanas foram usadas em uma ação truculenta”, sustenta.
O Ministério Público Federal (MPF) informou a existência de uma representação criminal baseada no inquérito da Operação Kollector. A Justiça Federal, por sua vez, apontou que, mais de três anos depois, o MPF ainda não ofereceu denúncia contra os investigados e por isso não existem réus ou processo sobre o caso.
Desencadeada no ano passado, outra operação da PF atingiu a atual gestão na Reitoria da Ulbra. Na ocasião, cinco pessoas foram indiciadas por falsidade ideológica em um inquérito que apurou irregularidades nos cursos de Ensino à Distância (EAD).