Polícia Federal prende 11 do setor de transportes do Rio suspeitos de propina
O esquema de corrupção envolvendo o transporte público rodoviário no Rio de Janeiro é um dos mais antigos no estado e continuou beneficiando o ex-governador Sérgio Cabral e a organização criminosa chefiada por ele mesmo após a saída do governo, segundo o procurador da República Eduardo El Hage.
De acordo com as investigações, valores desviados indevidamente eram encaminhados para Cabral como "prêmios" em troca de benefícios para as empresas de ônibus - como a concessão de reajustes nas tarifas.
Por volta das 19h50 desta segunda, onze pessoas foram presas na Operação Ponto Final - um dos alvos de mandados de prisão é considerado foragido e terá o nome encaminhados para a Interpol ainda nesta segunda, de acordo com a Polícia Federal. As investigações indicam que R$ 260 milhões em propina foram desviados das empresas de ônibus e pagos pelos investigados a políticos do estado.
Apenas Cabral recebeu R$ 122 milhões em propina, segundo o MPF. Um dos benefícios concedidos pelo ex-governador e investigado pelo MPF é a autorização para um reajuste de 7% nos preços das passagens em 2009, quando ele deveria ter sido de 2%.
"A gente tem informação de que o Sérgio Cabral, mesmo após ter largado o governo em 2014, manteve uma influência política decisiva e tinha muitos créditos a obter da Fetranspor [Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro], em razão das negociatas que ele fez durante o seu governo. Então, sempre que havia um reajuste o Sérgio Cabral recebia prêmios da Fetranspor e ele distribuía esses prêmios entre a organização criminosa dele", afirmou El Hage.
Em nota, a defesa do ex-governador garantiu que "não houve qualquer pagamento veiculado ao aumento das tarifas de ônibus no Rio de Janeiro". Segundo o texto, "durante o Governo Cabral, o Rio foi o estado que menos aumentou a tarifa na Região Sudeste e que criou o Bilhete Único, barateando a tarifa para o usuário.
"Não se pode afirmar nada baseado única e exclusivamente na palavra de um delator, sem nenhuma prova", ressalta a defesa do ex-governador.
Investigações
Segundo relato do doleiro e operador Álvaro José Novis em delação premiada, o presidente do Conselho de Administração da Fetranspor, José Carlos Lavouras, o procurou para “recolher regularmente dinheiro de algumas empresas de ônibus integrantes dessa Federação, administrar a sua guarda e distribuir a diversos políticos”.
Procuradora diz que pagamentos a Cabral continuaram após prisão de operador financeiro
Através das propinas que eram pagas para o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e para o Poder Executivo, os empresários conseguiam diversos benefícios, como a ausência de licitação, o reajuste do valor das passagens acima do previsto e isenções fiscais no IPVA e ICMS do diesel, por exemplo.
Além de Cabral, já preso, a operação identificou a participação de mais um agente público no esquema - Rogério Onofre, ex-presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do Rio (Detro). De acordo com as investigações, as ações dele atingiam de forma direta as empresas de transporte intermunicipal no Estado - como no caso do aumento das passagens acima do permitido.
Segundo as investigações, o dinheiro era recolhido nas garagens das empresas e contabilizado através de planilhas. Nelas, estavam o nome de diversas pessoas do setor de transportes, como o José Carlos Lavoura e Rogério Onofre, e operadores financeiros de Cabral, como Carlos Miranda.
As provas recolhidas indicam o uso da empresa de transporte de valores Trans Expert como ferramenta para lavagem e ocultação do dinheiro da propina. Segundo o MPF, a arrecadação formava a "caixinha da propina" para agentes públicos.
"Essa operação não nos surpreende na medida em que os esquemas do senhor Sergio Cabral e dos seus liderados já passaram pela Secretaria de Obras, já passaram pela Secretaria de Saúde, agora estamos falando do setor de transportes e, portanto, nessa medida o que a gente tem a reconhecer desses fatos é que ele loteou toda a estrutura governamental, todas os contratos foram objetos de pagamento de propina pra sua realização", explicou o procurador da República, Leonardo Freitas.
Para os investigadores, a organização criminosa que atua no setor de transportes também mostra indícios de "cartelização". O Ministério Público Federal (MPF) está pedindo a indisponibilidade de valores de Cabral e Miranda, relacionados aos R$ 260 milhões pagos em propina.
Segundo o procurador El Hage, o esquema criminoso, além de ser um dos mais antigos existentes no estado, é também um dos mais maléficos, "pois prejudica a população de baixa renda e paga tarifas além do que seriam as tarifas justas e adequadas, em razão do pagamento de vantagens indevidas a agentes públicos”.
Pagamentos permaneceram após saída de Cabral do governo
Operação antecipada
A operação precisou ser antecipada porque os agentes receberam informação de que o empresário Jacob Barata Filho, um dos alvos de mandado de prisão - embarcaria em um voo para Lisboa, em Portugal, neste domingo (2). Ele foi preso na área de embarque do aeroporto do Galeão, no Rio. Sua defesa, entretanto, nega que ele estivesse tentando fugir do país.
De acordo com a Polícia Federal, Barata já tinha mandado a família Portugal, uma atitude que indicaria uma provável fuga por ter conhecimento da investigação. Com o empresário, também foram apreendidos mais de R$50 mil em moedas estrangeiras.
Mandados de prisão preventiva confirmados:
- Jacob Barata Filho, empresário do setor de transportes, suspeito de ter recebido R$ 23 milhões em propina (preso)
- Rogério Onofre, ex-presidente do Departamento de Transportes Rodoviários do RJ (Detro), suspeito de receber R$ 44 milhões (preso)
- Lélis Teixeira, presidente da Federação das Empresas de Transporte do RJ (Fetranspor), suspeito de receber R$ 1,57 milhões (preso)
- José Carlos Reis Lavoura, conselheiro da Fetranspor, suspeito de receber R$ 40 milhões (está em Portugal e a PF acionará a Interpol para inclusão na difusão vermelha)
- Marcelo Traça Gonçalves, presidente do sindicato de ônibus e apontado como realizador dos pagamentos (preso)
- João Augusto Morais Monteiro, sócio de Jacob Barata e presidente do conselho da Rio Ônibus, suspeito de receber R$ 23 milhões (preso)
- Cláudio Sá Garcia de Freitas (preso)
- Márcio Marques Pereira Miranda (preso)
- David Augusto da Câmara Sampaio (preso)
Mandados de prisão temporária confirmados:
- Carlos Roberto Alves (preso)
- Enéas da Silva Bueno (preso)
- Octacílio de Almeida Monteiro (preso)