1976 foi um grande ano para o cinema. Dele, saíram clássicos lembrados até hoje. Entre os indicados ao Oscar do ano seguinte estavam obras primas como “Taxi Driver”, “Rede de intrigas” e “Todos os homens do presidente”.
Os dois últimos até foram os campeões da noite, mas sua vitória foi ofuscada pelo feito do grande azarão. Escolhido nas categorias de edição, direção e longa, “Rocky: um lutador” repetia a história que retratava: não levava exatamente o cinturão por pontos, mas a glória.
Desde então, o boxeador superou mais do que as adversidades que fizeram do filme um sucesso. Nas cinco sequências, Balboa ganhou cinturão, perdeu treinador, ganhou melhor amigo, se envolveu com uma paródia de Don King e - você deve se lembrar - terminou com a Guerra Fria ao derrotar um russo criado em laboratório para ser o lutador perfeito.
A escala do absurdo que o personagem teve de enfrentar fez muita gente esquecer que, um dia, “Rocky” mereceu a estatueta de melhor do ano. Mais do que isso, é difícil lembrar que Silvester Stallone foi o responsável pelo sucesso da produção: atuou e assinou o roteiro.
Mesmo com o Globo de Ouro de coadjuvante neste domingo (10), muitos estranharão quando, nesta quinta-feira (14), o nome de Sly aparecer entre os indicados ao Oscar por sua atuação em “Creed: nascido para lutar” - uma espécie de “Rocky - episódio VII” -, que estreia nos cinemas brasileiros no mesmo dia. Assista ao trailer acima.
Levantar e continuar em frente
Com grandes chances de estar entre os concorrentes a melhor filme, o longa coloca Rocky Balboa no papel de treinador de Adonis Johnson, filho do antigo campeão dos pesos pesados, Apollo Creed, morto durante sua luta no quarto capítulo da série.
O cineasta Ryan Coogler já havia mostrado talento para expor o ponto de vista do jovem negro americano em seu filme de estreia, “Fruitvale Station: a última parada” (2013). No roteiro e na direção de “Creed”, ele constrói uma narrativa de superação análoga à do primeiro “Rocky”. Mas dilui o foco, antes no protagonista, e apresenta três personagens com suas próprias batalhas..
Adonis (Michal B. Jordan), fruto de um relacionamento extraconjugal de Apollo pouco antes da fatídica luta contra Ivan Drago, luta para construir carreira no boxe, sem depender do legado deixado pelo pai. Sua namorada, Bianca (Tessa Thompson), é uma talentosa cantora de R&B que sofre com perda gradual de audição. Balboa, dono de um restaurante após a aposentadoria dos ringues, enfrenta a doença que matou sua mulher.
Stallone memorável
Jordan repete a parceria de “Fruitvale Station” com Coogler e mostra por que é um dos principais nomes emergentes da nova geração de atores, mas é Stallone quem entrega uma interpretação memorável. Aos 69 anos, o ator prova que consegue viver as emoções de uma pessoa normal preocupada com as inevitabilidades da idade avançada, provavelmente contido sob as orientações do cineasta.
Cada enredo de superação é entrelaçado pela evolução das relações entre os personagens. Manter as tramas alheias à armadilha fácil do melodrama - e dos longos discursos motivacionais de Stallone - é um dos maiores méritos do texto escrito pelo diretor.
É assim que se vence
Coogler também constrói o filme mais visualmente interessante da série. As lutas parecem longos planos sequência a partir da perspectiva dos boxeadores, resultando em alguns dos melhores confrontos fictícios do esporte retratados nos últimos anos.
Em entrevista ao site Vulture, o cineasta contou que teve a ideia de um novo filme da série focado em um filho de Apollo durante a faculdade. Com tudo isso em mente, é difícil não considerar o cineasta como o principal responsável pela volta da franquia à sua qualidade inicial, de 40 anos atrás.
Por isso é preocupante que, com o sucesso do filme, Stallone se mostre mais envolvido no processo criativo de uma inevitável continuação, enquanto Coogler assume o longa do “Pantera Negra” para a Marvel.
“Creed” tem potencial para evitar os erros de seus antecessores e se tornar uma série com seu próprio mérito, mas é importante que continue nas mãos certas. E que Sly prove ser mais parecido com Apollo ou Mickey do que com Paulie.