Um levantamento feito pelo Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) no Acre aponta que mais de 300 ex-hansenianos ainda lutam pelo direito a uma indenização garantida pela lei federal 11.520, de 18 de setembro de 2007, que atualmente beneficia apenas os ex-hansenianos que foram encaminhados para hospitais-colônia. Nesta quinta-feira (3), membros e ex-hansenianos se reuniram em uma sessão da Assembleia Legislativa do Acre para debater e tirar dúvidas sobre a lei.
Elson Inácio, de 66 anos, faz parte do grupo que não recebeu a indenização por não ter sido internado em hospitais-colônia na década de 40 e 80 no Acre. A deputada Maria Antônia (Pros-AC) já entrou com um pedido para que a Lei 11.520, de 18 de setembro de 2007, seja revisada e passe a beneficiar todos os ex-portadores, assim como os filhos que foram separados dos pais.
Inácio descobriu que era portador da doença quanto tinha 14 anos, depois de uma consulta realizada dentro de um barco que descia as águas do Rio Purus, no Amazonas. Ele conta que foi obrigado a ficar longe da família e depois de muito tempo ficou no Acre, onde passou a receber tratamento em um hospital.
“Eu morava no seringal Pauini, no Amazonas. Veio uma equipe de médicos de Manaus e passou no seringal fazendo consultas. Viram umas manchas estranhas no meu corpo e eram dormentes. Fiquei longe da família, fui discriminado e abandonado. Depois de um tempo, vim embora para Rio Branco e só não me internei na Souza Araújo [hospital-colônia] porque estava lotado”, relembra.
Segundo Inácio, ele não recebe a indenização porque os dados da sua entrada no hospital, que estão datados em 1990, não correspondem com a data prevista na lei para o isolamento, que é até 31 de dezembro de 1986.
“Hoje eu moro no hospital Souza Araújo. Não recebo a indenização porque eles alegam que a ficha que representa minha entrada é de 90. Mas, tem muitas pessoas que entraram lá, não tem ficha e recebem. Tenho um amigo que não tem ficha e só com testemunhas conseguiu ser beneficiado. Sinto-me injustiçado. Pense bem na minha situação. Eu vou me sentir de que jeito? Discriminado completamente”, reclama.
Assim como Inácio, João Pereira, de 58 anos, também foi separado da família, sofreu preconceito e não recebe pensão. Além da luta para conseguir a indenização, a história de vida dos amigos são bem parecidas. Pereira também descobriu que tinha hanseníase após uma consulta em um barco que chegava de Manaus. Ele passou 9 anos separado da família por causa da doença.
“Já lutei muito por essa indenização. A lei só beneficiou quem ficou nos hospitais-colônia. Eu fiquei internado, mas não cheguei aos hospitais-colônia porque não tive oportunidade, não sabia onde era. Com 9 anos eu descobri que tinha hanseníase. Fui separado da minha mãe e irmãos. Com 18 anos, me levaram para Boca do Acre, no Amazonas, dentro de um barco. De lá, me conduziram para a Souza Araújo, mas lá estava lotado e eu fui para o hospital de base, onde passei dois anos”, relata.
De acordo com Pereira, a indenização nada mais é do que um alívio de todo sofrimento enfrentado pelos ex-portadores. “Agora as pessoas sabem que a hanseníase tem tratamento, que estamos curados. Naquela época era feio. Eu nunca estudei, tinha que sair dez horas da noite para tomar banho, porque as pessoas não deixavam tomar banho de dia. Eu vivia totalmente escondido da sociedade. Se essa indenização é por causa do preconceito, eu sou um que já era para ter recebido. Eu me sinto discriminado de novo, do mesmo jeito que antes” diz.
Sessão na Aleac
Na manhã desta quinta-feira (3), representantes e membros do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) participaram de uma sessão na Assembleia Legislativa do Estado do Acre (Aleac), onde foi lançada oficialmente a Semana Estadual de Combate à Hanseníase.
A sessão foi presidida pela deputada Maria Antônia (PROS) , responsável pelo ofício pedindo ajuda aos deputados federais para que a lei seja revisada entregue à casa do povo no início do mês. Durante a sessão, foram homenageados médicos, especialistas e pessoas envolvidas no combate e divulgação de informações da doença.
“Estamos buscando reconhecimento para aqueles que não foram contemplados com a lei e que ficaram isolados em seringais e colônias. No Acre são aproximadamente 300 pessoas que estão nessa situação. Estamos com a bandeira de luta para os filhos que foram separados dos pais por causa da doença", disse o diretor do Morhan no Acre, Elson Dias.