Tragédia em Magdeburg vira disputa eleitoral na Alemanha
22 de dezembro de 2024Os primeiros esforços para instrumentalizar politicamente o atentado que matou cinco pessoas e feriu 200 em um mercado de Natal em Magdeburg, na Alemanha, começaram menos de uma hora após o ataque.
Ainda na sexta-feira, afirmações falsas nas redes sociais alegavam que cinco criminosos estavam envolvidos no atentado, entre eles três foragidos da polícia que teriam chegado na Alemanha como refugiados sírios, em 2015. Publicações ainda afirmavam, sem provas, que uma bomba foi colocada na feira natalina, o que não aconteceu.
Políticos alemães também aproveitaram o momento para distribuir críticas à gestão do chanceler federal alemão Olaf Scholz, do Partido Social-Democrata (SPD), e capitalizar apoiadores para suas agendas anti-imigração.
O apelo contra a presença de imigrantes no país tem ajudado partidos como a ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD) a angariar apoio popular e, segundo especialistas ouvidos pela DW, deve ser definidor para o resultado da próxima eleição legislativa no país.
Isso porque o atentado, e sua repercussão, acontece enquanto a Alemanha se prepara para uma eleição antecipada, que deve ser convocada para fevereiro.
Ultradireita evoca "remigração" após ataque
As críticas das oposição de Scholz se baseiam principalmente na nacionalidade do agressor – um cidadão saudita que vive na Alemanha desde 2006 –, ainda que ele fosse um simpatizante "anti-islã" de pautas de ultradireita.
"A AfD teria deportado este homem há muito tempo", postou Sven Tritschler, vice-presidente da AfD no Parlamento estadual da Renânia do Norte-Vestfália, nas redes sociais. Dominik Kaufner, membro da AfD na legislatura estadual de Brandemburgo, escreveu que "a migração em massa é o problema e a remigração em massa é a solução". A palavra "remigração" é um termo cunhado pela ultradireita para se referir à deportação em massa e expulsão de migrantes e seus descendentes. Ela foi repetida em protestos de grupos de extrema direita em Magdeburg, neste sábado.
Já Vanessa Behrendt, que compõe a bancada da AfD no Parlamento estadual da Baixa Saxônia, culpou partidos alemães como os social-democratas de centro-esquerda de Scholz, os democratas cristãos de centro-direita, os Verdes e o partido A Esquerda: "Eles são os responsáveis por isso. Somente eles", publicou.
Com os olhos voltados para as eleições gerais, a líder da AfD, Alice Weidel, candidata ao cargo de chanceler federal, também se manifestou. "Quando é que essa loucura vai acabar?", publicou em sua conta nas redes sociais.
Sahra Wagenknecht, do partido populista de esquerda BSW, que defende políticas de migração restritiva, criticou a falta de atenção das autoridades aos alertas emitidos pela Arábia Saudita sobre o suspeito. Segundo a agência de notícias alemã DPA o governo saudita informou à Alemanha que o agressor poderia representar uma ameaça em 2023.
Relembrando o recente ataque com faca na cidade de Solingen, na Alemanha, Wagenknecht, ainda pediu por "um plano de segurança convincente com foco claro na proteção da população".
'Narrativas de direita se espalham'
Para Benjamin Höhne, cientista político da Universidade Técnica de Chemnitz, cuja pesquisa se concentra nos partidos alemães, episódios como esse são um chamariz para narrativas de ultradireita se espalharem.
"A tendência está indo cada vez mais para a direita. [...] Uma política de migração aberta que tenta reconhecer os direitos humanos globais já caiu em desuso. Eventos catastróficos, como o que aconteceu em Magdeburg, provavelmente vão exacerbar isso", disse à DW.
"É esperado que os partidos, especialmente os da direita, tentem atacar a ministra do Interior [Nancy Faeser] e o SPD no tema da segurança. O SPD tem a responsabilidade pelo Ministério do Interior e pela segurança interna em nível federal, por isso tentará não ficar na defensiva por causa de Magdeburg."
Migração será central em nova eleição
Höhne acredita que a segurança e a migração estarão no centro dos debates da campanha eleitoral , como já ocorreu nas recentes eleições estaduais no leste da Alemanha.
Há um ênfase crescente na "segurança" na política alemã, segundo Höhne. "Isso significa que a migração é discutida quase exclusivamente como um risco de segurança potencial ou real", disse.
"Com isso, outras facetas da migração são deixadas de lado — como, por exemplo, como lidar com a escassez de mão de obra na Alemanha ou atrair trabalhadores qualificados. Eu acredito que o ataque em Magdeburg fortaleça ainda mais esse viés."
Atores estrangeiros
Há também esforços de atores estrangeiros para influenciar as eleições alemãs. Juntamente com a desinformação russa, o bilionário de tecnologia americano Elon Musk atacou o governo de Scholz. Aliado do presidente eleito dos EUA, Donald Trump, e proprietário da rede social X, Musk já endossou a AfD nas próximas eleições.
Logo após o ataque em Magdeburg, ele exigiu que Scholz renunciasse, chamando-o de "imbecil incompetente". "As instituições e autoridades do governo devem considerar se sua presença contínua no X é politicamente aconselhável. Deve ficar claro que Elon Musk está usando sua empresa para impulsionar sua agenda política na Alemanha. As instituições do governo federal da Alemanha não deveriam tolerar isso", disse Höhne.