O supercolisor de átomos que pode ajudar a desvendar 95% do Universo

Máquina científica

Crédito, Kate Stephens/BBC News

Legenda da foto, O detector Atlas tem o tamanho de um navio e é usado para medir alguns dos menores objetos do Universo
  • Author, Pallab Ghosh & Kate Stephens
  • Role, Da BBC News no Cern, perto de Genebra

Pesquisadores do maior acelerador de partículas do mundo, na Suíça, apresentaram propostas para criar um novo supercolisor muito maior do que o atual.

O seu objetivo é descobrir novas partículas que revolucionariam a Física e levariam a uma compreensão mais completa de como o Universo funciona.

Se o projeto for aprovado, o novo acelerador será três vezes maior que a atual máquina gigante da Organização Europeia para a Investigação Nuclear (Cern).

Mas o seu preço de US$ 15 bilhões (R$ 74,6 bilhões) desperta preocupações. Um crítico do projeto diz que um gasto dessa magnitude seria "imprudente".

Esse dinheiro — que é apenas o custo inicial de construção — viria dos países membros da Cern, incluindo o Reino Unido. Alguns especialistas questionaram se o projeto faz sentido do ponto de vista econômico.

A maior conquista do Grande Colisor de Hádrons (LHC) até agora foi a detecção de uma nova partícula chamada Bóson de Higgs em 2012. Mas desde então sua ambição de realizar duas grandes descobertas da Física — a matéria escura e a energia escura — não foi possível.

Alguns dos pesquisadores acreditam que existem opções mais baratas do que construir um novo supercolisor.

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A nova máquina é chamada de Future Circular Collider (FCC). A diretora-geral do Cern, professora Fabiola Gianotti, disse à BBC News que, se ela for aprovada, será uma "bela máquina".

"É uma ferramenta que permitirá à humanidade dar enormes passos na resposta a questões da Física fundamental sobre o nosso conhecimento do Universo. E para isso precisamos de um instrumento mais poderoso para responder a estas questões", disse ela.

O LHC, da Cern, está localizado na fronteira entre a Suíça e a França, perto de Genebra.

O LHC consiste em um túnel circular subterrâneo com 27 km de circunferência. Ele acelera o interior dos átomos (hádrons) no sentido horário e anti-horário a velocidades próximas à velocidade da luz e, em certos pontos, colide-os com mais força do que qualquer outro equipamento no mundo.

As partículas subatômicas menores que sobram das colisões ajudam os cientistas a descobrir de que são feitos os átomos e como eles interagem entre si.

Descoberta revolucionária

A detecção da partícula do Bóson de Higgs pelo colisor há mais de 10 anos foi inovadora.

A existência de um bloco de construção que dá forma a todas as outras partículas do Universo foi prevista em 1964 pelo físico britânico Peter Higgs, mas só foi descoberta no LHC em 2012. Essa foi a peça final do quebra-cabeça da teoria atual da física subatômica, que é chamada de Modelo Padrão.

A proposta é que o novo FCC seja construído em duas etapas. A primeira parte começará a operar em meados da década de 2040 e fará colidir elétrons. Espera-se que o aumento da energia produza um grande número de partículas de Higgs para os cientistas as estudarem em detalhe.

A segunda fase começará na década de 2070 e exigirá ímãs mais potentes — tão avançados que ainda sequer foram inventados. Em vez de elétrons, prótons mais pesados serão usados na busca por novas partículas.

O FCC terá quase três vezes a circunferência do LHC — impressionantes 91 km — e duas vezes mais profundidade.

Gráfico de colisor de partículas

Mas por que é preciso haver um colisor de hádrons ainda maior?

Isto acontece porque o LHC, cuja construção custou US$ 4,7 bilhões e começou a funcionar em 2008, ainda não foi capaz de encontrar partículas que ajudem a explicar 95% do cosmos.

Os cientistas ainda estão à procura de duas grandes incógnitas. Uma delas é a força chamada energia escura, que atua como o oposto da gravidade e separa objetos no Universo, como galáxias. A outra é a matéria escura, que não pode ser detectada, mas a sua presença é sentida através da gravidade.

"Estamos perdendo algo grande", diz Gianotti.

Ela diz que o FCC é necessário porque a descoberta destas partículas escuras levaria a uma nova teoria mais completa de como o Universo funciona.

Gráfico sobre matéria escura do Universo

Há mais de 20 anos, muitos pesquisadores do Cern previram que o LHC encontraria essas partículas misteriosas. Mas isso nunca aconteceu.

Críticos como Sabine Hossenfelder, do Centro de Filosofia Matemática de Munique, dizem que não há garantia de que o novo colisor terá sucesso.

"A Física de partículas é uma área de pesquisa grande e bem financiada por razões históricas, tendo crescido a partir da Física Nuclear, e precisa voltar a um tamanho razoável, talvez um décimo do seu tamanho atual", disse ela.

Um ex-conselheiro científico chefe do governo do Reino Unido, professor David King, disse à BBC News que acreditava que gastar US$ 15 bilhões no projeto seria "imprudente".

"'Quando o mundo enfrenta ameaças da emergência climática, não seria mais sensato canalizar estes fundos de investigação para esforços para criar um futuro administrável?'"

Tubo azul do acelerador de partículas

Crédito, ADAM HART-DAVIS/SCIENCE PHOTO LIBRARY

Legenda da foto, Feixes de partículas são acelerados dentro do tubo azul localizado nas profundezas da fronteira suíça-francesa

E há também um debate entre os próprios físicos de partículas sobre se um colisor circular gigante seria a melhor opção para se atingir os resultados desejados.

O professor Aidan Robson, da Universidade de Glasgow, disse à BBC que um colisor construído em linha reta seria mais barato.

"Existem três vantagens principais. Em primeiro lugar, uma máquina linear poderia ser feita etapa por etapa. Em segundo lugar, o perfil de custo seria bastante diferente — portanto, a etapa inicial custaria menos. E, em terceiro lugar, o túnel seria mais curto, e você poderia fazê-lo mais rápido", disse ele.

Mas a FCC é a opção preferida do Cern. É o resultado de uma ampla consulta entre físicos na Europa e em todo o mundo. O centro agora está em processo de avaliar a reação à sua proposta por parte dos seus países membros, que terão de pagar pela nova máquina.