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Luto

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Tristeza inconsolável: pintura de 1884 de Ivan Kramskoy

O luto (do latim luctu)[1] é um conjunto de reações a uma perda significativa, geralmente pela morte de outro ser. Segundo John Bowlby, quanto maior o apego ao objeto perdido (que pode ser uma pessoa, animal, fase da vida, status social etc.), maior o sofrimento do luto. O luto tem diferentes formas de expressão em culturas distintas.[2]

Cores

O uso de determinadas cores, por exemplo, pode indicar que um indivíduo ou grupo está em luto. Um povo ou país, quando ocorre a morte de uma personalidade importante, pode entrar em luto também, sendo comum decretações de luto oficial em diversos países. Na maior parte da cultura ocidental, quando um amigo ou familiar de uma pessoa morre, é comum essa pessoa usar roupas pretas para mostrar seus sentimentos de perda e respeito pela pessoa. O luto pode ser expresso sob a forma de diversas cores, que variam de país para país. As mais usuais são o preto e o branco, mas há exceções.

Na África do Sul, por exemplo, é habitual envergar-se o vermelho para se mostrar que se chora a morte de alguém. Já no Egito, é o amarelo. Na Índia, pode ser o castanho ou o branco. Na Tailândia, é o roxo. No Irã, é o azul. Ou seja: a cor do luto é um ato cultural muito diversificado. A regra, no entanto, divide-se entre o branco, mais usual nas civilizações orientais, como China e Japão, e o preto, nos países cristãos.

A origem do costume ocidental de vestir de negro por ocasião de uma morte é ancestral: já os antigos egípcios usavam esta cor com esse significado. Dos egípcios, a tradição passou para os romanos, que vestiam uma toga preta, sem ornamentos, nessas circunstâncias. A tradição espalhou-se pelos quatro cantos do Império Romano e foi adotada pela Igreja Católica. No entanto, o branco e o roxo também são identificados com o luto na nossa civilização.

Era costume os Reis de França colocarem véus brancos no período de luto. A tradição de se usar o preto deve-se ao fato de esta cor evocar a ausência, pois lembra a noite, a ausência de luz. Nas culturas em que é o branco a representar a morte, tal deve-se ao fato de evocar o silêncio, a leveza, a paz.

As sociedades utilizam diferentes cores para simbolizar a morte: no ocidente, é a cor preta que, tradicionalmente, indica o luto. Em muitos países do oriente, é o branco que representa a felicidade e a prosperidade no outro mundo. Os ciganos costumam vestir vermelho (cor que, para eles, simboliza a vida e a energia). Para os muçulmanos, as almas dos justos assumem a forma de aves brancas. Durante séculos, o branco foi a cor do luto na Inglaterra.[3]

Psicologia da morte

A característica inicial do processo de luto acontece pelas relembranças da perda, aliadas ao sentimento de tristeza e choro. Este é um processo que evolui, onde as relembranças são intercaladas com cenas agradáveis e desagradáveis, sem, necessariamente, serem acompanhadas de tristeza e choro. Além destes sentimentos, é comum o estado de choque, a raiva, a hostilidade, a solidão, a agitação, a ansiedade e a fadiga. Sensações físicas como "vazio no estômago" e "aperto no peito" podem ocorrer.

A duração deste processo é inconstante e seguido de uma notável falta de interesse pelo mundo exterior. Com o passar do tempo, o choro e a tristeza vão diminuindo e é esperado que a pessoa vá se reorganizando, porém é um processo a longo prazo e os episódios de recaída são comuns. Caso alguém não consiga lidar de uma forma socialmente adequada com a perda por mais de 6 meses, continue em intenso sofrimento e/ou não consiga se reorganizar, é considerado um luto patológico e é recomendado que se faça psicoterapia.

Existem escalas para medir a gravidade do luto que avaliam fatores emocionais, cognitivos, físicos, sociais, espirituais e religiosos. Um exemplo é a escala proposta por David Fireman.

O luto pode provocar uma crise na família, pois exige a tarefa de renúncia, de excluir e incluir novos papéis na cena familiar. Percebe-se, então, que existe, aí, uma complexidade, pois esta crise pode estagnar o desenvolvimento da família.

Entre alguns psicólogos, é comum se referir às pessoas em processo de luto pela perda de um ente querido como "sobreviventes", como forma de reforçar positivamente a luta pela sobrevivência diante de desafios difíceis.

Como forma de encarar melhor a morte, o psicólogo pode ressaltar o caráter de "fim de sofrimento" da morte ou mesmo estimular moderadamente crenças religiosas/espirituais positivas, independente da religião do indivíduo. Outra possibilidade é associar a morte com um descanso, tranquilidade, paz, retorno para a natureza e parte natural do ciclo da vida.

Luto na criança

Filhas do Príncipe Consorte Albert, de luto em 1861 ao lado de um busto representativo do pai

Mesmo bebês em fase antes de aprender a falar já demonstram o processo de luto, observável em desenhos e jogos. Entretanto, é somente a partir do período das operações formais que a criança pode compreender a morte enquanto fenômeno irreversível, universal e inevitável.[4]

Entre os fatores que influenciam o luto dos adolescentes e crianças, destacam-se: o apego e dependência com relação à pessoa perdida; a percepção que possuem da morte; o quanto tempo tiveram para se preparar para essa situação (luto antecipatório); e a forma de restruturação familiar no caso de perda de um membro da família.[5] Caso o luto não seja enfrentado adequadamente é comum resultar em depressão nervosa ou transtorno de estresse pós-traumático.

Para a psicologia, a própria passagem para a adolescência também consiste em um processo de luto da infância. Um luto dessa fase, mal resolvido, envolve um período mais prolongado de dependência dos cuidadores e, posteriormente, dos parceiros amorosos. Na psicanálise, refere-se o retorno à infância como "regressão".

Luto nacional

Ver artigo principal: Luto nacional

Luto académico

O luto académico[6] é posto em prática quando um estudante, professor, membro da instituição de ensino ou figura relevante morre. Caracteriza-se por todos os elementos trajados andarem de capa aos ombros sem dobras presa pelos ganchos e com as lapelas da batina viradas para fora (tapando a camisa branca, ao máximo) (na versão tradicional do Traje Académico de Coimbra/Porto/Lisboa) durante 3 dias, tendo previamente retirado todos os pins da lapela. Este ritual pode mudar consoante o código de praxe das diferentes instituições.

Em termos praxistícos, o luto académico geralmente é anunciado pelo Dux da comunidade ou em situações como luto nacional, os estudantes também realizam luto académico.

Qualquer pessoa que se encontre em luto pessoal, estando trajado pode optar por demostrar isso fazendo luto académico. Ficando todos os que a rodeiam a saber que se encontra de luto.

O luto académico foi transformado em manifestação política em abril de 1969, quando o corpo docente e discente da Universidade de Coimbra reuniu-se em Assembleia Magna e decidiu protestar contra a ausência de diálogo entre Governo e academia. Isto resultou no fecho da universidade e numa crise institucional que só iria terminar em julho do mesmo ano com a demissão do Ministro da Educação Nacional, José Hermano Saraiva.[7]

Como resultado desse Luto Académico, decretado ao tempo em que o então presidente da AAC era o estudante de Direito, o Dr. Alberto Martins, os estudantes que se opunham ao Estado Novo ou que simplesmente apoiaram a atitude do presidente Alberto Martins trajaram em Luto Académico (ver em Luto), enquanto os que apoiavam o regime, trajavam normalmente.

Foi então decretado que o uso do Traje Académico de Coimbra fosse abandonado até que o referido Luto Académico terminasse, i.e., quando se retomasse o diálogo entre a Academia de Coimbra e o Governo português. Isso aconteceu implicitamente a 25 de Abril de 1974.

Soube-se por fontes anónimas (impossível citar, fonte própria) que o retomar do uso do Traje Académico (Capa e Batina), assim como de outras tradições, era desejo de estudantes mais politicamente activistas, de certo modo ligados à "esquerda", mas foi desaprovada pelo Partido Comunista Português (PCP). Dada a ausência de provas, este facto é duvidoso mas pode ter alguma veracidade pelos actos deste partido em 1975 (Verão Quente de 75) que nada desejavam o "Poder da Comuna Estudantil Coimbrã".

Consolação

Na Antiguidade, a carta de consolação era um gênero literário popular, sendo essencialmente um veículo para apresentar aspectos cruciais de uma escola filosófica e ao mesmo tempo dar conselhos reais sobre como lidar com a perda e o luto. O gênero literário Consolação foi cultivado por todas as grandes escolas, nela, o filósofo procura entender a dor que abala a pessoa a ser consolada e, ainda, compreender sua visão de mundo para assim expor sua filosofia, de forma que seja melhor assimilada pelo espírito em luto. Cleonice van Raij, diz:

Entre os filósofos e retores romanos o primeiro que se ocupou desse gênero foi Cícero, por ocasião da morte de sua filha Túlia, quando escreveu uma Consolação, a fim de abrandar a própria dor. Tal Consolação, infelizmente, não chegou até nós, restando dela apenas alguns fragmentos conservados nas Tusculanas. Sêneca, sem a menor dúvida, foi o mais fecundo escritor latino de Consolações, se considerarmos não só os textos conhecidos sob esse nome, mas também os vários tratados de alto teor consolatório, como Sobre a brevidade da vida, Sobre a tranquilidade da alma e as cartas que, em grande parte, pertencem a esse gênero, como as LXIII, LXXXI, XCIII e CVII, dirigidas a Lucílio.

Sêneca escreveu três cartas de consolações:

Ver também

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Referências

  1. FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. 2ª edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986. p. 1 054.
  2. Bowlby J.(1982) Attachment and loss: Retrospect and prospect- American Journal of Orthopsychiatry, 1982 - interscience.wiley.com
  3. jaqueaferreira (2010). «tcheensino.pbworks.com». PB Works. Consultado em 12 de março de 2015 
  4. A. Aberastury & cols. (Org.), A percepção da morte na criança e outros escritos (pp. 128-139). Porto Alegre: Artes Médicas. (Original publicado em 1978)
  5. Bowlby, J. (1993). Separação: Angústia e raiva. Em Apego e perda: Vol. 2 (L. H. B. Hegenberg & M. Hegenberg, Trad.). São Paulo: Martins Fontes. (Original publicado em 1973)
  6. [1]
  7. «Luto Académico». Associação Académica de Coimbra. Consultado em 18 de janeiro de 2009 
  8. Erro de citação: Etiqueta <ref> inválida; não foi fornecido texto para as refs de nome :0
  9. «Resenha: Consolação a Márcia». O Estoico. Consultado em 16 de julho de 2020 
  10. «Consolação a Minha Mãe Hélvia» 
  11. O Estoico. «Resenha: Consolação a Políbio». Consultado em 12 de julho de 2020 

Ligações externas