Aborto no Chile
No Chile, o aborto era rigidamente proibido, haja vista que não existiam exceções para nenhum caso, nem mesmo em caso de estupro ou risco de vida da mulher. O país é considerado um dos que mais combatem a prática no mundo.[1] Um dos fatores que influenciaram nessa rígida legislação sobre o aborto é o fato de a Igreja Católica, que é contra a prática, ter forte influência política, de jure, porém, o Chile é um Estado laico.[1]
Aborto no Chile | |
---|---|
Permitido em caso de risco à vida da mulher, inviabilidade fetal e estupro. | |
Situação atual | |
Legalidade | Proibido, com exceções: risco à vida da gestante, inviabilidade fetal e estupro. |
Ano da lei | 2017 |
Penas | 3 a 5 anos de prisão |
História | |
Situações anteriores | 1894: proibido em todos os casos 1931: aborto terapêutico legalizado 1989: proibido em todos os casos |
No entanto, em agosto de 2017, a pauta promovida pela Presidente Michelle Bachelet foi aprovada no parlamento chileno, e mantida, mesmo após o oferecimento de recursos ao Tribunal Constitucional por parte de parlamentares de direita. Assim, ao rejeitar os recursos, o Tribunal Constitucional chileno, por 6 votos a favor e 4 contra, em decisão inapelável, decidiu pela possibilidade de aborto em caso de risco à vida da mulher, inviabilidade fetal e estupro.
Legislação
editarO aborto terapêutico foi permitido pelo Código de Saúde de 1931,[2] mas abolido pelo regime militar no país em 15 de setembro de 1989, com o argumento de que, devido aos avanços da medicina o aborto "não se justifica mais".[3] Antes da proibição, qualquer mulher cuja vida estava em perigo por causa da gravidez poderia solicitar o aborto caso fosse aprovada por dois médicos.[2]
As leis que proibiam o aborto estavam codificadas nos artigos 342 a 345 no Código Penal sob o título de "Crimes e Delitos contra a Ordem da Família, a Moralidade Pública e a Integridade Sexual".[4] A lei puno o aborto induzido por medicamentos e outras práticas, bem como o resultado de violência contra a mulher. A pessoa que faz o aborto com o consentimento da mulher também é punido. A pena para o procedimento é de 3 a 5 anos de prisão. A Constituição afirma no artigo 19-1 que "a lei protege a vida daqueles prestes a nascer".[5]
Desde 1990, 15 projetos de lei relacionados com o aborto foram apresentadas por parlamentares do Congresso para discussão; 12 na Câmara dos Deputados e 3 no Senado. Cerca de metade solicitando o aumento das penas e a criação de obstáculos legais para tornar mais difícil a legalização do aborto. Duas outras sugeriram a construção de monumentos para as "vítimas inocentes do aborto". Quatro projetos solicitaram que o aborto fosse legalizado em casos de risco de vida à gestante ou em casos de estupro. Até o início da década de 2010, nove estavam em andamento e um foi rejeitado, enquanto cinco foram arquivados. Dois projetos de lei idênticos solicitam o re-estabelecimento do aborto terapêutico, como era antes de 1989 e estão em revisão pela Comissão Médica da Câmara, a primeira foi apresentada em 23 de janeiro de 2003 e a última em 19 de março de 2009.[6]
Em novembro de 2004, a Organização das Nações Unidas pediu ao Chile que legalize o aborto em casos de estupro e incesto. Em 2007, o Conselho de Direitos Humanos da ONU expressou preocupação com as "restrições indevidas" das leis que regulam o aborto no país, especialmente em casos em que a vida da mulher está em risco.[7] O Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos também disse em maio de 2009 que as "leis de aborto são excessivamente restritivas".[7] Um projeto de lei encaminhado em janeiro de 2015 propondo a descriminalização do aborto em caso de risco de vida para a mulher, quando a gravidez resulta de um estupro, e quando o feto é inviável.[8]
Em março de 2016, a Câmara dos Deputados aprovou o aborto nas situações de inviabilidade do feto, estupro ou risco de morte para a mãe.
Em agosto de 2017, o Congresso aprovou o aborto nas situações de inviabilidade do feto, estupro ou risco de morte para a mãe.[9] O Tribunal Constitucional chileno rejeitou os recursos oferecidos pelos parlamentares de direita, que alegavam que o projeto de lei atentava diretamente contra a Constituição, que consagra o direito à vida. A decisão se manteve, por 6 votos à 4.[10]
Saúde feminina
editarA preocupação em torno das altas taxas de mortalidade materna decorrente do aborto ilegal levou o governo do Chile a lançar um programa de planejamento familiar em 1964.[11][12] As mortes em decorrência de complicações do aborto ilegal cairam de 118 para 24 a cada cem mil nascidos vivos entre 1964 e 1979.[11]
Houve também uma significativa diminuição estatística da mortalidade materna devido ao aborto de 1990 a 2010.[13] Atribui-se a queda nas internações por aborto durante esse período ao crescente uso de antibióticos e processos de esterilização pelos fornecedores de aborto ilegal, à maior disponibilidade do Misoprostol e ao aumento do uso de métodos contraceptivos.[12]
No período de 2000 a 2004, o aborto era a terceira principal causa de mortalidade materna no país, respondendo por 12% de todas as mortes maternas.[14] Embora não existam estatísticas precisas, é estimado que, entre 2000 e 2002, foram feitos entre 132.000 e 160.000 abortos ilegais no país.
Um estudo de 1997 mostrou que a maioria das oitenta mulher que foram processadas em Santiago tiveram um aborto quando eram jovens, mães solteiras e que trabalhavam como empregadas domésticas ou que haviam mudado da área rural para as cidades. Ele constatou também que a maior parte das mulheres que foram acusadas às autoridades pelo hospital em que procurou tratamento por suas complicações, não tiveram representação legal ou foram defendidas por estudantes inexperientes de direito.[15]
Ver também
editarReferências
- ↑ a b MAY, Catalina (23 de fevereiro de 2011). «Chile: where abortion isn't an option» (em inglês). The Guardian. Consultado em 17 de dezembro de 2011
- ↑ a b «ABORTO EN CHILE». Consultado em 30 de dezembro de 2010. Arquivado do original em 21 de janeiro de 2008
- ↑ «Aborto terapéutico: Demanda de las mujeres». Revista Punto Final (em espanhol). 11 de abril de 2003. Consultado em 17 de março de 2009. Cópia arquivada em 10 de abril de 2009
- ↑ «CODIGO PENAL» (em espanhol)
- ↑ «CONSTITUCION POLITICA DE LA REPUBLICA DE CHILE» (PDF) (em espanhol). Consultado em 17 de março de 2009
- ↑ «Chamber of Deputies» (em espanhol)
- ↑ a b «Organismos internacionales insisten en despenalizar aborto terapéutico en Chile» (em espanhol). 17 de março de 2009. Consultado em 23 de março de 2009
- ↑ «Chile: É hora de pôr fim à penalização total do aborto». Anistia Internacional. 5 de fevereiro de 2015
- ↑ Montes, Rócio (4 de agosto de 2017). «Congresso do Chile aprova lei que permite aborto ao menos em caso de estupro». "El País". Consultado em 2 de dezembro de 2018
- ↑ G1 (21 de agosto de 2017). «Tribunal Constitucional do Chile aprova descriminalização do aborto». G1. Consultado em 2 de dezembro de 2018
- ↑ a b United Nations Population Division. (2002). Abortion Policies: A Global Review. Retrieved 14 July 2006.
- ↑ a b Shepard, Bonnie L. and Casas Becerra, Lidia (2007). «Abortion Policies and Practices in Chile: Ambiguities and Dilemmas» (PDF). Reproductive Health Matters. 15 (30): 202–10. PMID 17938085. Consultado em 31 de dezembro de 2010. Arquivado do original (PDF) em 24 de julho de 2011
- ↑ Donoso Siña, Enrique. (2004). The reduction in maternal mortality in Chile, 1990–2000. Pan American Journal of Public Health, 15 (5). Retrieved March 25, 2007.
- ↑ «MORTALIDAD MATERNA EN CHILE, 2000-2004». Revista chilena de obstetricia y ginecología (em espanhol). 2006. Consultado em 17 de março de 2009
- ↑ Casas Becerra, Lidia (maio de 1997). «Women prosecuted and imprisoned for abortion in Chile». Reproductive Health Matters. 5 (9): 29–36. doi:10.1016/S0968-8080(97)90003-3