Foi o flagrante de um tiroteio entre policiais e traficantes no morro do Borel, na Zona Norte do Rio de Janeiro, que proporcionou a Sergio Telles ter suas imagens exibidas na rede norte-americana CNN. Cinegrafista em uma emissora concorrente, ele registrou a perseguição pelos becos do morro e, pela primeira vez, viu um policial atingido pelo tiro de uma poderosa arma americana: o fuzil AR-15. Os ferimentos no corpo do policial eram tão graves que o repórter-cinematográfico ficou na dúvida: grava ou não? Gravou. As imagens reais da guerra do tráfico de drogas no Rio rodaram o mundo e conquistaram a admiração dos supervisores do jornalismo da Globo, onde Sergio trabalha desde 1995.
O pai de Sergio Ricardo Barros Telles, Aroldo da Silva Telles, foi iluminador. Trabalhou em televisão, cinema e teatro até se aposentar. A mãe, Neide Maria Barros Telles, é fonoaudióloga. E talvez por influência dela, Sergio pensou em cursar medicina, mas desistiu no meio do caminho. Perto de completar 18 anos, o pai sugeriu que ele fizesse um curso de operador de áudio. O jovem fez e logo emendou em outro de sonoplastia. Contratado em 1986 pela extinta TV Manchete, trabalhou no esporte como assistente de câmera, passou a operador de vt e, depois de um teste, foi promovido a repórter-cinematográfico.
O contato inicial de Sergio Telles com a Globo foi em 1995, quando o repórter-cinematográfico passou 20 dias na emissora cobrindo férias, a convite do então supervisor, José Augusto. Foram três anos de prestação de serviço para a editoria Rio até que, em 1998, foi chamado para trabalhar, com contrato, na GloboNews. Começou cobrindo assuntos que eram exibidos no 'Em Cima da Hora' e, mais adiante, passou a participar dos programas, incentivado pelo atual supervisor José Carlos Azevedo. “Essa mudança para programas fez com que tudo de bom acontecesse depois.”
O 'Arquivo N' era um dos programas que mais o atraíam. Era o espaço onde ele podia expressar o gosto pela luz: “Era só depoimento e a gente tinha que ter uma locação e uma luz bacana. Eu gostava de trabalhar essa luz. E meu pai, como foi iluminador, me ensinou muita coisa. Era um prato cheio. Nem sempre tinha um refletor arriflex para gente recortar; então pegávamos umas gelatinas e íamos experimentando para ver o que ficava bom, o que dava certo, o que não dava”.
Pelo mundo
Desafios, pautas fartas e diversas, viagens internacionais. Começava assim uma nova fase para Sergio Telles. Na primeira viagem para o exterior, com o repórter Eduardo Grillo, o susto: “Caramba, não estou vendo o meu tripé”. Chegaram na Noruega, sem parte do equipamento: o tripé tinha sido despachado na França. Hora de se virar e gravar o rei e a rainha do país à altura da família real e da efervescente política mundial, época em que o país nórdico se recusava a entrar para a União Europeia. O assunto rendeu dois programas 'Pelo Mundo'.
Próximo destino: Grécia, com a repórter Christiane Pelajo e Marcelo Lins, como produtor na época. A equipe foi escalada para cobrir os Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, e chegou antes para contar um pouco da história do país aos brasileiros. Foram quatro programas exibidos em um 'GloboNews Especial'.
Outra cobertura que marcou a trajetória de Sergio Telles na GloboNews foi a viagem a Mali para cobrir o Fórum Social Mundial, em 2005. Impressionado com as condições de vida de um dos países mais pobres da África, chamou a atenção do cinegrafista a quantidade de cegos pelas ruas. A doença era causada pela falta de saneamento básico. “As pessoas não têm o hábito de fazer higiene direito e elas coçam o olho o tempo todo, isso causa uma inflamação que acaba levando à cegueira. Era também uma poluição muito grande, as pessoas lavavam as mãos com água suja e reaproveitada”.
Na Alemanha
Em 2006, Sergio Telles, o repórter André Trigueiro e o produtor Gustavo Gomes foram para a Alemanha cobrir a Copa do Mundo. Mas as cabeças dos profissionais não ficaram voltadas somente para o futebol. Viajaram além dos campos, encantados com o modo de vida no país. Foi durante essa cobertura que surgiu a ideia de gravar o piloto de um programa voltado para o desenvolvimento sustentável: o 'Cidades e Soluções'.
Sempre que sobrava tempo entre uma gravação e outra, a dupla saía em busca de histórias e imagens para o novo programa que seria apresentado à direção da Globo. “Estávamos num país que tinha tudo a ver com energia sustentável. Os alemães têm essa preocupação com o futuro, já trabalhavam com energia solar. Víamos isso nas casas, as pessoas sabendo que aquele investimento não era barato, mas não estavam poluindo, não estavam usando energia nuclear, hidrelétrica, simplesmente energia solar ou cata-vento.” O programa foi aceito e está no ar até hoje na GloboNews. “Quando o André lançou o livro 'Cidades e Soluções', eu falei: ‘tenho que ir nessa noite de autógrafos’ porque como ele mesmo diz, fiz parte desde o início.”
Além de ter sido berço da criação do programa 'Cidades e Soluções' - e palco da eliminação do Brasil pela França de Zidane -, a Alemanha proporcionou a Sergio e André uma entrevista imprevisível e quase impossível de ser feita sem hora nem data marcadas. Em um labirinto de Berlim, onde crianças costumam brincar, Sergio viu de longe um escritor jurado de morte pelo Irã, em 1989: o britânico de origem indiana, Salman Rushdie, que escreveu o supostamente blasfemo “Os versos satânicos”. “Ele conversou com o André no meio da rua. Não era pautado, foi um encontro.”
China
Um ano antes da Olimpíada de Pequim, em 2007, Sergio e a repórter Ana Paula Campos passaram quase um mês na China para mostrar os hábitos, pouco conhecidos, do povo oriental. Além dos costumes, a equipe também revelou os extremos da cidade partida: o lado desenvolvido de Pequim e outro, miserável. E uma pergunta não saiu do pensamento: “Como eles conseguiam se desenvolver tanto, economia equilibrada, continuando com esses vilarejos tão pobres?” Os questionamentos foram sendo desenvolvidos em sete programas que viraram um DVD, distribuído entre os funcionários que iriam cobrir os Jogos Olímpicos, em 2008.
Correspondente internacional
O convite para ser correspondente da Globo nos Estados Unidos surgiu antes da viagem à China. A sugestão foi do repórter Rodrigo Alvarez, que achava ideal Sergio ir para a Califórnia, onde a tecnologia estava revolucionando o mercado e o modo de viver das pessoas. Mudanças na informática aconteciam a todo o momento e nem sempre eram cobertos pela Globo em função da distância do escritório de Nova York.
Convite aceito, sonho de ter o primeiro filho adiado, Sergio Telles e a mulher Flávia, produtora da Globo, fizeram as malas e partiram para São Francisco, em novembro de 2007. Mal chegaram, ele seguiu para Las Vegas onde cobriria a entrega do prêmio Grammy Latino para o 'Bom Dia Brasil'. Sergio lembra que foi um ano de descobertas: “Internet. As coisas estavam começando a acontecer na telinha do computador, os canais de YouTube, Vale do Silício, vimos as transformações acontecerem na nossa frente. Fui fazer matéria na Google umas quatro vezes.”
Tensão no Rio Hudson
Em 2008, mantendo a parceria com Rodrigo Alvarez, Sergio Telles põe novamente o pé na estrada. Desta vez, rumo a Nova York, onde dividiu as coberturas com os repórteres-cinematográficos Orlando Moreira, Sherman Costa e Luiz Claudio Azevedo.
A primeira reportagem “ de peso” foi o acidente com o avião que fez um pouso de emergência no Rio Hudson, em 2009, e que originou o filme “O Milagre do Rio Hudson”, de Clint Eastwood. Sergio e Rodrigo estavam em Nova York gravando para o programa 'Mundo S/A', quando receberam um chamado do escritório com a seguinte informação: um avião tinha acabado de pousar em pleno Hudson. “Quando nós chegamos era aquela imagem que vocês viram. As pessoas sendo resgatadas, saindo na asa do avião, polícia cercando a área, porque eles afastam a imprensa. E começamos a gravar e o frio aumentando porque estávamos na beira do rio, um frio, um frio, frio.”
Perto de entrar, ao vivo, no 'Jornal Nacional', a baixa temperatura quase paralisou a equipe. Rodrigo Alvarez não conseguia falar e as mãos de Sergio endureceram, mas, no final, os brasileiros puderam acompanhar imagens inéditas do resgate dos passageiros e da tripulação.
Americanos
Na terceira reportagem da série “Americanos”, sobre as eleições presidenciais nos Estados Unidos, os repórteres Rodrigo Alvarez e Sergio Telles chegam a Chicago, cidade onde Barack Obama tem mais votos, e examinam o comportamento dos eleitores americanos muçulmanos. Jornal da Globo, 29/10/2008.
Era 2008, ano de eleições nos Estados Unidos. Após oito anos no governo, a popularidade de George W. Bush está em queda e o cidadão americano quer mudança significativa no poder. As pesquisam apontavam para o crescimento de Barack Obama que, se eleito, seria o primeiro presidente negro dos EUA.
Para mostrar a esperança do eleitor e a disputa entre os candidatos democrata e republicano (John McCain), a dupla Sergio Telles e Rodrigo Alvarez fez a série 'Americanos'. “O Obama era carismático, simpático, democrata, negro, tinha um apelo com os jovens, as pessoas querendo uma mudança radical e ele vai e ganha as eleições. Foi uma aceitação muito grande pelo eleitor americano, nós ficamos muito felizes também de ter acompanhado todo o processo.”
O ídolo pop e o furacão
“Sergio, pega a sua mala que nós vamos viajar agora para Los Angeles. Michael Jackson morreu”. A voz do outro lado da linha era do repórter Rodrigo Alvarez que, aflito com as notícias que chegavam, queria voar logo para a cidade onde vivia o astro pop. Sergio Telles acabava de chegar em casa depois de um dia de trabalho e foi logo separar as roupas. Mas apesar da correria, a equipe não conseguiu embarcar naquele dia. Os voos estavam superlotados.
Rodrigo Alvarez entrevista a brasileira Remi Vale Real, que durante quase duas décadas foi cozinheira do cantor Michael Jackson. Fantástico, 28/06/2009.
No dia seguinte, Sergio, Rodrigo, Luiz Claudio Azevedo e Rodrigo Bocardi viajaram com a missão de fazer um 'Globo Repórter' e abastecer os telejornais com reportagens sobre Michael Jackson, que morreu em 2009, aos 50 anos, após uma parada cardíaca. Sergio e Alvarez ficaram responsáveis pelas reportagens de comportamento e no final de agosto, quando foi anunciada a data do enterro de Michael Jackson, eles voltaram a Los Angeles.
Três anos depois, todas as equipes de correspondentes nos Estados Unidos foram mobilizadas para acompanhar a chegada do furacão Sandy e a retomada da vida nos pontos atingidas, como Atlantic City, lugar com uma grande concentração de cassinos que virou uma cidade fantasma. “A cidade não recebia mais turistas, os moradores abandonaram as casas, a economia despencou. Restaram apenas os seguranças e a polícia tomando conta dos cassinos que ficavam com os letreiros acessos à noite.”
Em Nova York, ruas foram inundadas, estações do metrô alagadas, árvores foram arrancadas pela raiz pelas fortes rajadas de vento. A fachada de um prédio desmoronou e mais de 500 mil pessoas ficaram sem luz.
Sergio lembra que a área onde ele morava não estava no mapa de riscos, mas o sul da ilha de Manhattan, sim. E é onde fica o escritório de Nova York. “Ficamos sem luz por uns quatro, cinco dias. Nós tivemos que alugar um anexo da agência AP e mandávamos o material para editar no Brasil”.
Imagens do cinegrafista mostraram a noite anterior, quando o Rio Hudson havia subido três metros acima do normal. Novas explosões em uma subestação de energia haviam deixado boa parte da cidade às escuras. A visita do presidente Barack Obama ao Estado de Nova Jersey, o mais afetado pela tempestade, também foi mostrado em matéria de Júlio Mosquéra e Sergio Telles. O furacão Sandy atingiu os países do leste caribenho, Nova York e Nova Jersey, causando destruição e morte.
No espaço
O lançamento do ônibus espacial mereceu uma ampla cobertura das redes de televisão estrangeiras. Foi tratado como um evento. Da Globo, foram destacados três profissionais: Sergio Telles, Rodrigo Bocardi e David Presas. E havia uma fila de carros para entrar em Cabo Canaveral, tempo que a equipe não podia perder em função de uma entrada ao vivo no 'Jornal Naclonal'. Bocardi não perdeu tempo: saiu da fila, correu por fora e, claro, foi parado por um policial que queria saber o motivo de tanta urgência. Por sorte, situação resolvida.
“Era a imprensa do mundo todo, estruturas muito fortes e a gente ali, nós três, vamos que vamos, e éramos a única TV brasileira. Resolvemos fazer uma passagem na hora em que o ônibus estivesse decolando e o Rodrigo não poderia errar. E ficou aquele espaço limpo, ninguém atrás do Rodrigo, só o relógio, o ônibus espacial lá embaixo e aí o relógio dá zero, o Rodrigo começa a falar, acionam o motor lá trás, começa a subir, eu vou do Rodrigo para ele e vou até onde tem campo visual. Ficou bacana demais e aí o Rodrigo perguntou: ‘Deu tudo certo? ’eu falei: ‘Cara, lindo, está lindo, vai para o ar muito bonito, com muita honra’.
Reportagem de Rodrigo Bocardi e Sérgio Telles sobre o último voo realizado pela “Atlantis”, que marcou o fim do programa de ônibus espaciais norte-americano, Jornal Nacional, 08/07/2011.
Batman por um dia
Antes de voltar para o Brasil, em 2013, Sergio retornou a São Francisco, a cidade por onde começou a escrever sua trajetória como correspondente internacional. Lá, conheceu o menino que queria ser o Batman, uma história que comoveu os americanos e gente do mundo inteiro. Sergio Telles estava lá para contar.
Reportagem de Júlio Mosquéra e Sergio Telles sobre a realização do sonho do menino Milles, que sofria de leucemia e queria ser o Batman. Milhares de pessoas se mobilizaram e organizaram a encenação da aventura do garoto, em São Francisco, EUA. Fantástico,17/11/2013.
Milles tinha 8 anos na época, sofria de uma doença grave e alimentava um sonho: queria viver um dia de super-herói. A família decidiu pedir ajuda. Prefeitura e empresas privadas aceitaram tornar realidade o desejo do garoto. Cenários foram espalhados por toda a cidade e Milles viveu o Batman por um dia. “Eles reproduziram situações de perigo e o pequeno homem-morcego salvou uma menina que estava amarrada na linha de trem; impediu um assalto a banco; botou Pinguim e Charada na cadeia e, no final, recebeu a chave da cidade fictícia.”
Reportagens sobre o sonho do menino mobilizaram equipes de jornalismo de vários países e Milles se transformou em um exemplo de amor e esperança para o mundo. O menino foi diagnosticado com leucemia aos 2 anos de idade e, durante o tratamento, se apegou ao desejo de livrar a cidade da violência.
Outras reportagens
Reportagem de Rodrigo Bocardi sobre a cerimônia em tributo ao cantor Michael Jackson que aconteceu no Staples Center, em Los Angeles, EUA. Jornal Nacional, 07/07/2009. Reportagem de Hélter Duarte e Sergio Telles sobre as particularidades do sistema eleitoral americano. Jornal Nacional, 05/11/2012.
Reportagem de Hélter Duarte e Sergio Telles sobre as particularidades do sistema eleitoral americano. Jornal Nacional, 05/11/2012. Nas crônicas de NY, os repórteres Alan Severiano e Sérgio Telles visitam uma ilha que não economiza em cenários e é pouco conhecida por turistas e mesmo pelos moradores de Nova York. Jornal Hoje, 14/09/2013.
Nas crônicas de NY, os repórteres Alan Severiano e Sérgio Telles visitam uma ilha que não economiza em cenários e é pouco conhecida por turistas e mesmo pelos moradores de Nova York. Jornal Hoje, 14/09/2013.
Fonte
Depoimento concedido por Sergio Telles ao Memória Globo em 18/09/2017. |