Por Memória Globo

Renato Velasco/Memória Globo

O sonho de adolescente era fazer faculdade de Educação Física. Jogador de vôlei federado, Sergio Aguiar queria associar o esporte a um curso superior. Desistiu depois de não ver perspectiva de trabalho na área. Pensou no que mais o atraía: História, Geografia, Comunicação Social? Descobriu no jornalismo um prazer e uma vocação. Dono de uma voz grave e marcante, ele passou por duas rádios e pela extinta TV Manchete até ser convidado para a estreia do primeiro canal de notícias 24 horas do Brasil: a GloboNews, onde ficou até 2019.  

Sergio Aguiar na GloboNews, 2014. — Foto: Estevam Avellar/Globo

Sergio Ricardo Soares Aguiar é filho do bancário Sergio d’Almeida Aguiar e da enfermeira Lea Marina Soares Aguiar, já falecidos. O futuro jornalista começou a trabalhar em 1990, na Rádio Tupi. Como era de praxe com todo estagiário, as pautas que recebia da chefia de reportagem giravam em torno de notícias policiais. Assim, Sergio ganhou espaço, teve a oportunidade de conhecer a cidade e de entrevistar personagens importantes nas áreas de economia e política. “Com 21 anos, estar lidando com o Presidente do Banco Central, o Presidente da República. Você vai ganhando experiência no impulso”. Sergio Aguiar foi contratado como locutor-entrevistador e permaneceu na Tupi até 1993. 

O trabalho do jornalista é levar notícia para o público, mas com cautela

EXCLUSIVO MEMÓRIA GLOBO



Webdoc GloboNews – Em Cima da Hora (1996) e Jornal GloboNews (2010)

As principais coberturas jornalísticas da GloboNews, desde 2007 até 2016, com depoimento dos profissionais que fizeram parte dessa história em depoimentos exclusivos do Memória Globo.

As principais coberturas jornalísticas da GloboNews, desde 2007 até 2016, com depoimento dos profissionais que fizeram parte dessa história em depoimentos exclusivos do Memória Globo.

Depois de iniciar sua carreira, em 1990, como estagiário na Rádio Tupi, onde foi contratado e permaneceu até 1993, Sergio Aguiar foi para a rádio CBN. Lá, encontrou melhores condições de trabalho, como mais agilidade para as entradas ao vivo. Um sistema de rádio instalado nos carros de reportagem possibilitava ao repórter falar com a emissora de qualquer lugar. Sergio conta como começou no Sistema Globo de Rádio: “Eu tinha mandado meu currículo para o Laerte (Laerte Rimoli, então chefe de redação da CBN) e uma fita cassete com reportagens. Passado um tempo, voltei a ligar e falei: ‘Laerte, algum potencial de vaga?’ Ele disse: ‘Olha, vaga eu não tenho, mas tenho uma licença médica.’ Eu falei: ‘Quero agora.’ Comecei no dia seguinte e, cinco meses depois, fui contratado.”

Sergio Aguiar ficou na CBN de 1993 a 1996, onde ganhou experiência e maturidade. Cobriu a repercussão de eventos como a Copa do Mundo de 1994, quando a seleção brasileira conquistou o tetracampeonato nos Estados Unidos; a morte de Ayrton Senna no circuito de Ímola, na Itália, e a onda de sequestros no Rio de Janeiro. ‘‘Era quase um sequestro atrás do outro. A gente ficava na casa da família do sequestrado, do lado de fora, aguardando informações e tinha que entrar a qualquer momento. Um dos que mais me marcaram foi o do filho do presidente da Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro). Não lembro ao certo o tempo que ele ficou em cativeiro. A gente permanecia de plantão. Era um desafio. A cada momento, uma pessoa de classe média alta era sequestrada.”

Depois de algum tempo na reportagem, Sergio passou a apresentar o noticiário local (RJ) jornal da tarde da CBN ( Show da Notícia) e plantões nos jornais do Rio com três horas de duração. “Você não só tem um leque maior de assuntos para debater, como têm os imprevistos que forçam você a administrar melhor a dinâmica do ao vivo.”

Estreia na TV

Sergio Aguiar estava na CBN quando foi convidado para trabalhar na extinta TV Manchete. Não era fácil conciliar os dois empregos. O jornalista lembra que a sorte era que as emissoras ficavam no mesmo bairro. Essa rotina durou um ano e meio. Foi a estreia dele na televisão. “ O clima era de unidade e parceria na Manchete”. Entre outros eventos, Sergio fez matérias sobre o festival de música Hollywood Rock, que recebia várias estrelas internacionais, como a cantora Whitney Houston”.

Em 1996, veio o convite para trabalhar na recém-inaugurada GloboNews. A proposta partiu da então diretora do futuro canal, Alice-Maria, que precisava de mais um nome para a apresentação. Alice e Evandro Carlos de Andrade, então diretor-geral da Central Globo de Jornalismo, viram um flash de Sergio na emissora concorrente. O jornalista relembra: “ Alice olhou para o Evandro e perguntou: ‘ o que você acha dele?’. E o Evandro: ‘Bom’. Aí ela me chamou e entrei para a GloboNews.”

Estreia da GloboNews: Sergio Aguiar, Maria Beltrão, Eduardo Grillo, Christiane Pelajo, André Trigueiro, Márcio Gomes e Renata Vasconcellos, 1996 — Foto: Arley Alves

Aguiar foi contratado como repórter e a direção sugeriu que ele fizesse um teste para apresentador. Vera Íris Paternostro, chefe de redação na época, o levou até o estúdio da TV, espaço nada familiar para ele. “Eu sem sabia como era aquela coisa de maquiagem e preparação para a apresentação. Foi tenso, mas passei.” Daquele dia em diante, Sergio passou a fazer pilotos para que a direção pudesse definir em qual dupla de apresentadores ele se encaixaria. Maria Beltrão e Márcio Gomes passaram a apresentar os jornais da manhã; Renata Vasconcellos e Eduardo Grillo, os da noite e André Trigueiro o 'Jornal das Dez'.

Ao lado de Christiane Pelajo, Sergio Aguiar passou a trabalhar no horário da tarde, fazendo o 'Em Cima da Hora', que hoje é o 'Jornal da GloboNews'. A dupla apresentava cinco jornais por dia, de meia-hora, fora eventuais transmissões ao vivo. “A gente estava chegando, com vontade de aprender. Íamos usando as emissoras internacionais, BBC e CNN, como referência, adaptando e criando o nosso próprio formato, a nossa própria linguagem.”

Em tom de brincadeira, ele comenta que foram tantos jornais apresentados nessa primeira fase da GloboNews que até um dos principais locutores da emissora ficava para trás: “Em dez anos, tínhamos apresentado mais que o Cid Moreira em 40 anos de profissão. A gente apresentava os jornais, saía, tinha os textos para gravar do próximo jornal, depois voltava para a redação, lia o jornal seguinte, sendo que você tinha que estar cinco minutos antes no estúdio, para fazer teste de microfone e enquadramento. Ou seja, sobrava pouco tempo para você, tipo uns 15 minutos, 10 minutos, para olhar o jornal, ver se a linguagem estava do jeito que você queria, mudar ou questionar determinadas coisas, ver se tinha entrevistado para o jornal seguinte, por telefone ou ao vivo no estúdio e checar o que ia abordar com o entrevistado.”

Coberturas ao vivo

Sergio Aguiar lembra um dos primeiros desafios na apresentação na GloboNews: a queda do Fokker da TAM em 1996, em São Paulo. Pela primeira vez, a programação normal foi substituída pela transmissão contínua da notícia. Uma longa e dolorosa cobertura. “Você tinha que produzir perguntas para os parentes, especialistas, professores. A cabeça tinha que funcionar de forma rápida. As pessoas querem que você participe da melhor forma, e nem sempre é fácil. O imprevisto era o maior desafio“.

No dia 12 de junho de 2000, o jornalista acompanhou uma das mais marcantes coberturas da GloboNews: o sequestro do ônibus 174, no Rio de Janeiro, quando um assaltante manteve dez passageiros como reféns. Sergio observa que as coberturas ao vivo mudaram de formato depois do episódio: “Aumentou o cuidado em relação às transmissões. Claro que a gente recebeu críticas por estar transmitindo a execução de uma pessoa ao vivo. As execuções do Estado Islâmico na Síria, por exemplo, eles fornecem as imagens e a gente não mostra tudo. Mas o trabalho do jornalista é levar notícia para o público, mas com cautela. Essas são as lições que a gente conseguiu tirar desse caso.”Todo jornalista se lembra de onde estava e o que estava fazendo no dia em que a maior potência do mundo sofreu uma série de ataques terroristas. E não foi diferente com Sergio Aguiar naquele 11 de setembro de 2001. “ Estava chegando na academia, olhei para a televisão e vi a imagem do avião atingindo uma das torres, explodindo. Pensei que aquilo fosse um filme ou algo parecido. Cheguei na emissora, continuei anotando tudo. Não tinha internet no início da GloboNews e a Alice-Maria havia passado uma orientação pra gente: ‘ Vocês precisam ter uma pasta com tudo que possa ter uma repercussão maior, alguma medida que esteja prestes a ser anunciada, alguma personalidade que esteja em um estado crítico de saúde, que possa morrer etc.’ Comecei a anotar tudo porque as informações chegam desencontradas nesses ataques e entrei ano ar bem mais informado.”

Outro acontecimento que marcou a carreira de Sergio Aguiar foi a morte da cantora Cássia Eller, em 29 de dezembro de 2001. O repórter estava cobrindo uma rebelião em um presídio de segurança máxima, em Bangu, no Rio de Janeiro, quando recebeu um telefonema da redação dizendo que a cantora estava internada, em estado grave. Cássia Eller havia tido um infarto. Sérgio foi um dos primeiros repórteres a checar ao hospital e dar a notícia em rede nacional. “Recebi a notícia do falecimento 30 segundos antes de entrar no ar. Fiquei desconcertado, mas fui o primeiro a dar a notícia.”

'Em Pauta'

Após dez anos apresentando o 'Em Cima da Hora', o jornalista decidiu assumir um novo desafio ao participar da criação do programa 'Em Pauta', em 2009. Ele foi chamado por Luiz Cláudio Latgé para integrar a equipe do telejornal ainda em fase embrionária. O novo programa seria exibido no horário da propaganda eleitoral, em 2010.

“A TV a cabo não transmite o horário eleitoral, então boa parte da audiência [da TV aberta] vai migrar. O Latgé disse que teriam comentaristas em São Paulo, Nova York e Brasília, com o intuito não só de aproveitar a mão de obra qualificada desses jornalistas da rede, como também o sinal de Brasília, São Paulo e Nova York, que era subaproveitado".

O 'Em Pauta' é apresentado de segunda à sexta-feira e , no início, contava com os jornalistas Gerson Camarotti, Elizabeth Pacheco, Fernanda Santos, de Nova York. Passou a contar também com Eliane Cantanhêde ( Brasília); Mara Luquet e Thaís Heredia (São Paulo); Guga Chácara e Jorge Pontual (Nova York). Depois, deixou de ter convidados e ficou mais focado na análise dos comentaristas. “A nossa comunicação hoje em dia é feita por e-mail, whatsapp, rede social. Ficou muito mais ágil.”

Um quadro que se tornou fixo foi o 'Poema em Pauta', com Jorge Pontual. Admirador de Charles Baudelaire, Pontual chegou a traduzir um poema e recitar o poeta francês, ao vivo, em um dos aniversários do telejornal. “É um diferencial. Ele também é tradutor e apaixonado por poemas, poesias e as pessoas vêm isso como uma virtude do programa.” Além de apresentar quadro, Jorge Pontual também é responsáveis pelos momentos descontraídos do jornal. Aguiar comenta que existe o Pontual da Globo, do Milênio, do Sem Fronteiras e o Pontual do Em Pauta, da GloboNews. “Ele pode dançar o Gangnam Style, botar fantasia de Drácula no Halloween. Eu mesmo corri a meia maratona e a gente fala sobre isso no programa. Ali não está o comentarista, nem o apresentador. É um fator que atrai o público.”

Sérgio ressalta também que, muitas vezes, o repórter é vítima da notícia, como aconteceu nas manifestações de 2013. Geralmente, no início do 'Em Pauta', ocorriam os momentos mais tensos, de quebra-quebra e não era raro o programa ficar no ar durante duas horas. “Acho que fomos fiéis nas transmissões. Nos fins de semana, geralmente no domingo, eu ficava até sete horas ao vivo. Narrando e repercutindo com os nossos comentaristas.”

Outros ataques terroristas que sacudiram o mundo também foram lembrados pelo jornalista na entrevista para o Memória Globo. No atentado à maratona de Boston, em 2013, um dos terroristas foi cercado pela polícia norte-americana no horário do programa: “As informações eram atualizadas a cada momento. A confirmação de que ele tinha morrido também foi no horário do Em Pauta, que neste dia teve duas horas de duração.”Impossível para Sergio não lembrar o massacre no jornal satírico Charlie Hebdo, em Paris. Seja pela violência do ataque terrorista quanto pela data do atentado: 7 de janeiro de 2015, dia do aniversário do apresentador. Nesta data, o programa foi monotemático. “Além da repercussão, explicamos como surgiu o Estado Islâmico e o risco que representava para o mundo inteiro. No outro atentado na França, no mesmo ano, tnhamos uma repórter que estava de férias lá, a Carolina Cimenti. Ela estava no estádio onde acontecia o amistoso entre França e Alemanha. Ficamos o tempo todo mostrando a operação da polícia francesa para prender os terroristas e também resgatar as vítimas.”

'Fantástico'

Substituir ícones do telejornalismo brasileiro é um desafio. E o que dizer sobre substituir a voz de Cid Moreira? Sergio encarou a proposta. “Durante quatro anos, substitui a voz dele nas narrações do 'Fantástico'. Foi um divisor de águas. Eram textos fortes, de denúncia e a abertura do programa: ‘Domingo, 24 de agosto, você vai ver agora no Fantástico.’” Aguiar fez essas narrações até o programa passar por nova reformulação.

'Brasil TV'

Um profissional com múltiplas funções é o perfil de Sergio Aguiar. Além do envolvimento com o 'Em Pauta', como a escolha de, até, nove temas por dia e os contatos e acertos com comentaristas, o jornalista passou a apresentar, a partir de 2016, o 'Brasil TV', telejornal gravado que entra no ar no horário do noticiário local para o telespectador que usa antena parabólica. “Na Olimpíada, o Brasil TV deu várias reportagens sobre os medalhistas, o esquema de segurança, dei também no Em Pauta. Enriquece profissionalmente e é gostoso de fazer.”

Depois de 22 anos na GloboNews, Sérgio Aguiar deixou a emissora em janeiro de 2019.

FONTE:

Entrevista concedida por Sergio Aguiar ao Memória Globo em 29/08/2016
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