Por Memória Globo

Renato Rocha Miranda/Globo

Daisy Lúcidi em Paraíso Tropical, 2007 — Foto: Renato Rocha Miranda/Globo

O primeiro contato de Daisy Lúcidi com o mundo da arte foi no palco. Foi acompanhando seu pai nos ensaios de um curso de teatro amador que conquistou seu primeiro papel, ainda com seis anos de idade, na peça 'Nuvem', de Coelho Neto. Embora tenha atuado no teatro, na televisão e no cinema, foi no rádio que se realizou. Fez parte do primeiro elenco da Rádio Globo e consagrou-se nas radionovelas da Rádio Nacional, onde, em 1971, passou a comandar um programa próprio. 'Alô Daisy' ficou mais de 45 anos no ar. Se a carreira de atriz abriu espaço à de radialista, esta a conduziu à política. Foi vereadora e deputada estadual durante 18 anos. Depois de 31 anos longe da televisão, voltou às telas na novela 'Paraíso Tropical' (2007), de Gilberto Braga e Ricardo Linhares. Pouco tempo depois, reconquistou o público como a cafetina Valentina, de 'Passione' (2010), de Silvio de Abreu.

Meu negócio é o rádio, que é a minha paixão.

Início da carreira

Daisy Lúcidi Mendes – o último sobrenome, herança do casamento de mais de 60 anos com o jornalista esportivo Luiz Mendes – nasceu no Rio de Janeiro, no dia 10 de agosto de 1929. Seus pais, Clarice Lopez e Quinto Lúcidi, eram de origem portuguesa e italiana, respectivamente. Foi acompanhando o pai, um ator amador, que ingressou no teatro. Ele costumava levá-la, ainda criança, para acompanhá-lo no curso de teatro que frequentava, além de marcar cenas com a menina em casa. Ao notar, durante um ensaio, que precisavam de uma criança para um papel, a pequena Daisy se ofereceu: “Eu ensaio uma peça em casa toda noite com o meu pai!” foi o argumento usado pela menina, de apenas seis anos. Conseguiu o papel e estreou na peça Nuvem, de Coelho Neto, no teatro Dulcina, no Rio de Janeiro.

Rádio Tupi

Em 1941, foi contratada para integrar o elenco infantil da Rádio Tupi. O convite veio do diretor, Teófilo de Barros Filho, que participou de uma comissão julgadora de um concurso no qual a menina competia como atriz. “E aí, comecei a fazer rádio. Eu era tão pequena que tinha que subir naquele tamborete do maestro para poder chegar ao microfone”, lembra Daisy. Seria pela sua atuação no rádio, primeiro como atriz e, depois, como radialista, que seria celebrizada.

Rádio Globo

Três anos depois, no dia 1º de dezembro de 1944, o jornalista e empresário Roberto Marinho inaugura a Rádio Globo. Para concorrer em grande estilo no novo mercado, foram contratados alguns dos mais importantes profissionais do ramo, como o novelista Amaral Gurgel e a atriz Zezé Fonseca. “Fui fazer parte do elenco da Rádio Globo, que começava com força total. Fizeram um grande elenco, porque a novela começava a aparecer”, conta a atriz, que passou a fazer parte da equipe de atores já no início de 1945.

Daisy Lúcidi acompanhou o crescimento da nova rádio, que começou transmitindo seus programas do Teatro Rival e, depois, passou para o teatro Carlos Gomes, ambos no centro do Rio de Janeiro, até inaugurar estúdio próprio. Participou de programas como 'O Grande Teatro Eucalol', 'O Fantasma Voador', 'Rancho Alegre', 'Atualidades', 'Conversa Puxa Conversa' e de novelas como 'Mar Morto', 'Sonho de Amor', 'Sinhá Rosa é um Amor', 'Pedro Mestiço', 'Bocage – sua vida aventurosa e romântica', entre outras. Na Rádio Globo, conheceria o companheiro da vida inteira, jornalista esportivo Luiz Mendes, que, à época, comandava o programa 'Alô, Rio'. O casamento de duas estrelas do rádio causou rebuliço na época e ficou marcado nas memórias da atriz: “Foi uma loucura, a igreja lotada. O padre mandou fechar a porta! E foi um casamento lindíssimo, maravilhoso. A gente pôde até testar a nossa popularidade, que era muito grande”.

Mudança para a Rádio Nacional

Não demorou até que a Rádio Nacional, mais importante emissora da época, a chamasse para integrar seu elenco, o que aconteceu em 1952. “A Nacional sempre me convidava, mas eu tinha um carinho muito grande pela Rádio Globo, porque fui para lá muito menina. Lá eu me casei, lá tive meu filho, então havia uma ligação forte com a Rádio Globo”. Na Rádio Nacional, Daisy participou de séries e novelas de sucesso, como tramas que posteriormente Janete Clair adaptaria para a Globo. São os casos de 'Rosa Malena', exibida na emissora como 'A Rosa Rebelde', e 'Vende-se Um Véu de Noiva', que, como 'Véu de Noiva', revolucionaria a linguagem da teledramaturgia, ambas levadas às telas em 1969.

Daisy viveria a época de ouro da Rádio Nacional, mas também seu declínio. Com o Golpe de 1964, o governo militar iniciou um desmonte no veículo, com a troca da direção-geral, de Moacyr Areias para Mário Neiva Filho, e a perseguição a vários de seus quadros. “Os militares começaram a ir lá, mas não entendiam nada daquilo. Estavam muito preocupados com o processo político, se alguém era comunista, aquelas coisas. Amolavam muito; toda hora você tinha que descer para responder a inquéritos, e aquilo desgastou. A Rádio Nacional começou a perder o radioteatro, não tinha mais anúncio… Com Getúlio Vargas ela era do governo, mas o governo não se metia. Aquilo era uma engrenagem extraordinária. De repente a gente viu ruir. Foi um momento muito difícil, muito triste, que nós passamos dentro do rádio”, relembra. Paradoxalmente, o momento abriu uma nova etapa na carreira de Daisy.

Programa 'Alô Daisy' e ingresso na política

Em 1971, com a reformulação da programação da Rádio Nacional, Daisy Lúcidi passou a apresentar um programa próprio, o 'Alô Daisy', produzido por Lourival Marques, cuja natureza ela caracteriza como “de prestação de serviços”. Com quadros de música popular, campanhas de teatro e cinema, debates sociais com a participação de presidentes de associações de moradores, direções de creches, líderes feministas, além do serviço de doações como a de cadeira de rodas, ou a obtenção de internamentos, entre outros. 'Alô Daisy' ficou mais de 45 anos no ar, transmitido de segunda a sexta-feira, e abriu à então radialista as portas da política. Daisy Lúcidi iniciou seu primeiro mandato como vereadora, em 1976, sendo em seguida eleita para a Assembleia Legislativa, como deputada, por quatro mandatos consecutivos, pelos partidos PDS, PFL e PPR.

O projeto da candidatura teria partido da insistência da então deputada federal pelo Arena Lygia Lessa Bastos, e Daisy conta ter resistido num primeiro momento: “Eu disse: ‘Ah, não, não tenho a menor vocação para isso, não gosto de política. Meu negócio é o radio, que é a minha paixão’”. Quando foi eleita, além do programa, estava em cartaz em uma peça e, no ar, na novela 'O Casarão'. A carreira de atriz cedeu, momentaneamente, espaço para a parlamentar, mas jamais abandonou sua vocação de radialista. Inclusive, credita ao rádio sua boa atuação legislativa. “O rádio me dava embasamento para levar as coisas para política. Eu sabia o que estava acontecendo na cidade através do rádio. A comunidade vinha a mim e dizia”, esclarece.

Carreira na televisão

Daisy Lúcidi atuou em três novelas da Globo nos anos 1970. Além de interpretar Alice em 'O Casarão' (1976), participou de 'Supermanoela' (1974) e 'Bravo!' (1975).

Ao longo de sua trajetória, Daisy Lúcidi atuou em teleteatros TV Rio e na TV Tupi, fez cinema, diversas peças teatrais – foi parte da Cia de Procópio Ferreira – e também foi apresentadora do 'Programa Sem Censura' na TV Educativa.

Daisy Lúcidi em Passione, 2010 — Foto: Blenda Gomes/Globo

Depois de 31 anos longe das telas, Daisy Lúcidi voltou à Globo no papel de uma síndica reacionária em 'Paraíso Tropical' (2007), mostrando que atuar é como andar de bicicleta: jamais se esquece. Mas foi como a cafetina Valentina, de 'Passione' (2010), que reconquistou o público. A vilã maltrapilha marcou seu retorno triunfal e ainda revelou todo o talento da atriz para a geração que ainda não a tinha visto nas telas. Em 2013, fez uma participação em 'Tapas & Beijos', e, em 2014, viveu a elegante Consuelo, em 'Babilônia'. No ano seguinte, teve a participação estendida na novela 'Geração Brasil'. Ela e a atriz Lady Francisco, como Marlene e Madalena, contracenavam com Aracy Balabanian, que interpretava Iracema.

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Daisy Lúcidi morreu no dia 7 de maio de 2020, vítima de Covid-19.

FONTES:

A Noite, 11/02/1955; EFEGÊ, Jota. “A quase rainha agora é deputada” In O Globo, 16/01/1983; “Daisy Lúcidi: importante voz feminina do rádio braisleiro” In: O Dia, 05/09/1976; “Alô Daisy” In: Última Hora, 06/11/1982; MURCE, Renato. Bastidores do Rádio: fragmentos do rádio de ontem e de hoje. Rio de Janeiro; Imago, 1976; https://robertomarinho.globo.com/hgg/; “Radio Nacional”, “Rádio Tupi”; e “Lygia Maria Lessa Bastos: in Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro. CPDOC/FGV: Rio de Janeiro; “Radialista Daisy Lúcidi completa 90 anos” in: http://radios.ebc.com.br/especiais/2019/08/radialista-daisy-lucidi-completa-90-anos; “Atriz e radialista Daisy Lúcidi morre por covid-19 aos 90 anos” in: Agência Brasil, 07/05/2020.
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