O Brasil Que Eu Quero

Era um passo significativo na integração entre a TV e a internet, já que a proposta, cujo embrião veio de uma ideia da produtora Clarissa Cavalcanti, era que o público enviasse os vídeos via g1.

Responsáveis por projetos especiais à época, Maria Thereza Pinheiro e Teresa Cavalleiro contaram, em texto publicado no livro 'JN: 50 Anos de Telejornalismo’, quais eram os principais desafios do projeto. “Não sem alguma resistência, fomos à luta, preocupados com a grande incógnita do projeto: a resposta do público. Dessa vez, estávamos dividindo a responsabilidade. E se o público não se interessasse? E se, mesmo interessado, não conseguisse enviar o vídeo por dificuldades de conexão com a internet ou pelas limitações do celular disponível?”

A solução foi uma campanha, com jornalistas ensinando o público a gravar. “A campanha deu tão certo que o pedido para ‘gravar com o celular na horizontal’ rendeu vários memes nas redes sociais e virou até fantasia de carnaval, inequívocos sinais de adesão ao projeto”.

Ao longo de sete meses -- de março até outubro, às vésperas do pleito eleitoral --, os mais de 50 mil vídeos recebidos foram exibidos em todos os sete telejornais da rede. O projeto foi um sucesso, recebendo material de 99,5% dos municípios brasileiros. Para a empreitada, foi fundamental a participação do departamento de Tecnologia da Globo, que desenvolveu uma plataforma para recepção e filtragem dos vídeos. Além disso, a produção fazia uma busca profunda na internet para garantir que nenhum deles trabalhava em campanha eleitoral ou tinha relação com políticos.

Mas o projeto não acabou com a exibição dos vídeos. No 'Jornal Nacional', por exemplo, uma série de reportagens foi realizada como desdobramento dos temas mais abordados no conteúdo enviado pelos espectadores, como saúde, educação, saneamento, racismo. Os repórteres Gabriela Azevedo, Marcio Gomes, Vinicius Leal, Pedro Bassan, Lilia Teles, Alan Severiano foram alguns dos que realizaram essas matérias.

William Bonner contou em depoimento ao Memória Globo como surgiu a ideia do desdobramento:

"Para o ‘JN’ eu sugeri que a gente mostrasse assim: 'O Brasil que eu quero é possível, já existe e é logo ali' (...). Então, digamos, educação, vamos ao Instituto Ayrton Senna perguntar quais são os bons exemplos de educação que poderiam ser replicados para o Brasil inteiro com lucro para o ensino no país. Aí eu pego um exemplo do Ceará. E pego os arquivos de 'O Brasil que eu quero', e acho um cara do Ceará para quem educação é importante. Aí eu pego meu repórter, mando lá na casa desse cara, falo assim: 'Você quer educação, né? Por que que você pediu isso?', 'Ah, porque a escola aqui é uma droga...', 'Então vem cá, que eu vou te levar num lugar onde existe o Brasil que você quer. E é no Ceará'. Levo o cara para uma escola que é modelo e vou mostrar como é que ela funciona. Ficou sensacional!"

Confira a reportagem sobre saúde, outra área muito demandada nos vídeos, a partir da demanda de um senhor no Mato Grosso do Sul:

Em outro desdobramento, alunos do interior do Maranhão conseguiram uma escola nova após professor mandar vídeo reclamando das condições da antiga, que não tinha nem banheiro. A história dele foi para no 'Globo Repórter' e, meses depois, o desfecho feliz foi mostrado no 'JN'.