Grand Illusion

Grand Illusion

Se posicionar no mundo pressupõe reconhecer iguais ou diferentes com a finalidade de estabelecer uma base de realidade a partir de determinada perspectiva; por conseguinte, se movimentar no mundo envolve a decisão sobre como interagir socialmente de acordo com esse juízo de proximidade ou distância relativa — ora mais, ora menos consciente. Ainda que fronteiras não sejam naturais e sim formuladas pelos homens, elas existem de fato à medida em que são assimiladas enquanto elementos constitutivos do espaço real e isso vale para outros princípios de delimitação ou diferenciação. Convenções podem ter e não ter materialidade ao mesmo tempo — ilusão é crer que uma coisa anula a outra. La Grande Illusion transita entre a ideologia pacifista (o internacionalismo) e seus limites instintivos (a necessidade de pertencimento social em oposição a algo) — sem que as premissas para sustentar uma tese absolutamente coerente sejam consolidadas a rigor. Renoir busca defender que as diferenças de classe são mais significativas do que o resto, mas ainda assim os vínculos de nacionalidade não se dissipam em seu filme. Pois afinal, a questão se refere à divergência entre afinidade (a identificação aristocrática de von Rauffenstein com de Boëldieu) e compromisso (o patriotismo militarizado). Talvez não haja ponto de referência mais categórico para a vivência masculina do que a relação homossocial entre homens da mesma classe e será justamente isso a abalar tanto von Rauffenstein (von Stroheim) no contato com de Boëldieu (Fresnay): a visão de seu semelhante já sujeitado pela marcha da história (a Revolução Francesa, referida por ele, ciente do fim iminente); e a aquiescência tácita do francês quanto à obsolescência das maneiras suavemente taciturnas que acabam por refletir o próprio destronamento.

& +: lucassaturnino.substack.com/p/franca-1937

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