Por Bianca Garutti*, g1 Campinas e Região


Após câncer de laringe, casal sem cordas vocais encontra amor em coral da Unicamp

Após câncer de laringe, casal sem cordas vocais encontra amor em coral da Unicamp

Sem cordas vocais, um casal de laringectomizados totais de Campinas (SP) prova que o amor não precisa de muitas palavras, mas sim de grandes atitudes. Após serem diagnosticados com câncer, os dois fizeram a retirada total da laringe e, hoje, mostram a importância um do outro sem precisar da voz.

💘 Por ironia do destino, a história de amor dos aposentados Joaninha Jamarco e Anísio Scareli começou em um coral da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) destinado a pacientes que, assim como eles, tiveram que reaprender a viver, encontrando novas formas de expressão e comunicação.

“Acabamos ficando juntos e estamos até hoje. E vamos até o último dia das nossas vidas, se Deus quiser”, garante o aposentado.

Neste sábado (27), Dia Mundial de Conscientização e Combate ao Câncer de Cabeça e Pescoço, o g1 conversou com o casal e acompanhou uma apresentação do grupo para entender os benefícios da música na recuperação dos pacientes laringectomizados.

De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 700 mil novos casos de câncer de cabeça e pescoço são diagnosticados no mundo anualmente. Em Campinas, segundo a Saúde, foram 400 internações relacionadas a esse tipo de câncer entre janeiro de 2020 e junho de 2024.

História de amor doe Joaninha Jamarco e Anísio Scareli começou em coral — Foto: Bianca Garutti/g1

De mala e cuia 💼

Além do fato de compartilhar o mesmo problema de saúde e a realização da laringectomia, o casal se uniu também por outro fator importante (e curioso): a altura. Por serem menores que os demais pacientes, Anísio e Joaninha sempre estavam próximos durante as apresentações do coral.

Apesar da proximidade, nenhuma palavra era trocada entre os dois. Em 2016, Anísio ficou viúvo. Com a nova realidade e sem desistir do amor, ele foi pouco a pouco se aproximando de Joaninha, por meio de “paqueras”, até tomar a decisão de fazer as malas e ir morar com ela “de surpresa”.

“Nós viemos participar do coral, aí eu já trouxe a minha mala dentro do carro. Conversando, eu falei para ela: ‘eu vou levar você na sua casa e vou ficar na sua casa’ e assim aconteceu. Eu fui e fiquei”, conta o aposentado.

Há três anos, em 28 de junho de 2021, o casal decidiu oficializar a união por meio de um casamento no civil e convidou a responsável pela aproximação dos dois, a fonoaudióloga e coordenadora do projeto, Vaneli Colombo Rossi, para ser madrinha da união.

“Eu acho que Deus ajudou nós dois. Foi o maior presente, porque nós temos o mesmo problema. [...] Eu entendo ele, porque eu tenho igual a ele, e ele me entende porque ele também tem, então dá certo”, diz Joaninha.

Fonoaudióloga foi convidada para ser madrinha de Anísio e Joaninha no casamento civil — Foto: Arquivo pessoal

Coral como grupo de apoio 🤝

Inspirado em outros projetos musicais com pacientes laringectomizados, o conjunto é uma criação do Instituto de Otorrinolaringologia & Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Unicamp (IOU) e, em março de 2024, completou 10 anos de existência.

Apesar de parecer inusitado pessoas que perderam a voz participarem de um coral, a fonoaudióloga Vaneli Colombo Rossi afirma que o conjunto não tem o objetivo de alcançar a excelência musical, mas sim de ser um grupo de apoio e motivação a pessoas que perderam a voz após o câncer.

Segundo a coordenadora do projeto, existem poucas pesquisas acerca da comprovação da eficácia da música na recuperação dos pacientes, mas para ela, o maior impacto do projeto é na melhora da qualidade de vida dos participantes.

“O intuito do coral é sair da doença e trazer eles para a vida. Mostrar que eu posso ter uma vida normal, voltar a ter uma vida. E eles, até quando eu convido, falam: ‘nossa, mas eu não canto’, e eu falo ‘mas vai cantar’. Então é uma nova possibilidade”, explica Rossi.

Coral melhora qualidade de vida de pacientes laringectomizados na Unicamp

Coral melhora qualidade de vida de pacientes laringectomizados na Unicamp

Música como forma de expressão 🎵

Como outra forma de incentivar a expressão corporal e promover a descontração entre os pacientes, a apresentação acompanhada pelo g1 contou com coreografias e alongamentos ao som de músicas variadas.

Para a especialista em dança sênior, fonoaudióloga e responsável por coordenar os movimentos durante a apresentação, Leandra Marquezine Seixas, a música consegue gerar emoções e estimular os dois hemisférios cerebrais: o direito e o esquerdo.

Com a ativação simultânea das duas partes, a capacidade cognitiva do indivíduo é melhor desenvolvida, contribuindo para o desempenho de atividades como a fala, explica Seixas.

“A ideia é fazer com que eles se expressem de outras formas. Então, se não pode falar, o corpo vai fazer um gesto, a expressão facial vai mudar, eu vou desenhar, eu vou escrever. Vou dar um jeito de me comunicar”, comenta.

Grupo de laringectomizados realizou coreografias e alongamentos durante a apresentação musical — Foto: Bianca Garutti/g1

*Estagiária sob supervisão de Gabriella Ramos.

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