Universitária autista treina o próprio cão de assistência para evitar crises
Diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA), Giordanna Bonone, de 20 anos, conta com uma ajuda extra para evitar crises. A universitária, moradora de Campinas (SP), treinou o próprio cão para ser um animal de assistência.
Segundo Giordanna, o cachorro, chamado Apolo, foi ensinado a identificar sintomas e, assim, sinalizar para que ela consiga agir a tempo de impedir uma crise. Além disso, o cão, da raça Labrador, ajuda a dona a socializar.
Em 2 de abril, comemora-se o Dia Mundial de Conscientização do Autismo. Como muitos portadores de TEA, Giordanna recebeu o diagnóstico já na fase adulta, aos 18 anos, apesar de apresentar sintomas desde a infância.
"Eu tinha crises, que pareciam crises de ansiedade, tanto que [inicialmente] foram diagnosticadas como crises de ansiedade, mas na verdade não era. E também, eu sempre fui muito agitada, muito sistemática", explica.
Apolo, de 1 ano e 10 anos, foi treinado pela sua dona com espectro autista para prevenir crises — Foto: Rhawnan Baldez
A chegada do Apolo
Giordanna foi diagnosticada com autismo nível 1 de suporte e com transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), e logo depois, passou a treinar o Apolo, que na época tinha 2 meses, para ser seu cão de assistência. Enquanto a jovem compreendia a sua nova condição, ensinava seu cão a como ajuda-lá.
"A gente tem que primeiro se aceitar para poder entender que precisa de ajuda, né? E quando eu entendi que eu realmente precisava de ajuda em certas coisas. Tinha todo esse processo de me entender com o diagnóstico, e entender para o que eu precisava treinar ele", explica.
Estudante de graduação em Terapia Ocupacional, a jovem já tinha experiência no adestramento de cães. Fez o primeiro curso aos 15 anos e, desde então, já treinou outros cachorros de serviço, como cães-guias para deficientes visuais, e animais de assistência.
No caso do Apolo, o treinamento foi para ser um agente de prevenção das crises. Se Giordanna der qualquer sinal de que pode ter uma crise, o cão dá um alerta para ela se retirar do ambiente.
Giordanna e Apolo — Foto: Giordanna Bonone
Apolo acompanha a universitária em todos os lugares possíveis: desde a faculdade até para shows e festas, contribuindo com a socialização dela.
"Normalmente, a gente vai em lugares que ele já está familiarizado. São sempre os mesmos bares e festas, então ele já está acostumado com as pessoas e com o lugar. E a gente sempre fica longe do som, e se ficamos perto, colocamos o abafador [de som] dele", conta Giordanna.
Como funciona o alerta
Professora do curso de Terapia Ocupacional da PUC-Campinas, Gisele Casacio convive com a dupla regularmente e percebe de perto a ação do Apolo para antecipar a crise. Segundo ela, em caso de um episódio, o cão coloca a pata em cima da estudante ou pula no colo dela.
Desta forma, explicou a professora ao g1, a própria jovem consegue se autorregular, evitando a crise e conseguindo retornar para o ambiente e atividade que ela estava fazendo.
"Os cães de assistência são essenciais no suporte a crise das pessoas com espectro autista. E as pessoas com o espectro se sentem mais seguras do lado de um cão.", disse a professora
Apolo acompanha Giordanna em todos os lugares, inclusive em festas (mas sempre protegido do barulho). — Foto: Giordanna Bonone
Segundo Giordanna, além de ajudar a evitar crises, Apolo foi essencial para a socialização dela, que agora consegue se enturmar nos lugares.
"Ele me ajuda a ser mais sociável, a querer interagir mais com as pessoas e criar vínculos. Porque, [com o Apolo] as pessoas vêm conversar comigo por causa dele, por curiosidade mesmo, para saber por que eu estou com cão e o que ele faz. Com isso, elas acabam conversando comigo e a gente cria vínculos, e e eu acabo tendo mais interesse em interações sociais do que eu tinha antes."
A veterinária Marta Luppi, professora da PUC-Campinas com experiência em adestramento, esclarece que os cães de assistência, como o Apolo, mesmo tendo recebido um treinamento específico para auxiliar sua tutor, ainda mantém uma relação de carinho e afeto com a dona, como os outros animais domésticos.
"O cão de assistência não é um cão infeliz e explorado. Quando a pessoa com deficiência o recebe [o cachorro], ele passa a ser o tutor dele. Então, estar na companhia desse tutor é o que eles mais gostam", explicou.
*Sob supervisão de Gabriella Ramos e João Gabriel Alvarenga