Por Águas do Rio


Rio de Agora — Foto: Divulgação

Plantar bromélias no manguezal é uma atividade que deixa Mario Moscatelli, 59 anos, feliz. Nascido e criado em Copacabana, famoso bairro do Rio de Janeiro, ele sabe que o cuidado com o meio ambiente gera uma cadeia de benfeitorias para todos os moradores da cidade e, também, do mundo.

Biólogo com 35 anos de atuação na proteção e recuperação de manguezais, ele toma conta desses ecossistemas litorâneos, que existem na transição entre a terra firme e a água, em uma extensa faixa que vai do município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, até Paraty, na divisa com São Paulo.

Seu trabalho técnico e de ativista ambiental o tornou referência no assunto. Junto com as equipes da empresa de consultoria ambiental que criou, opera verdadeiras transformações em áreas até então degradadas. A Lagoa Rodrigo de Freitas, ponto turístico da capital carioca, é um exemplo.

“Há 30, 40 anos, a biodiversidade nela era quase nenhuma, morria peixe toda hora. Hoje tem até aves que nunca tinham sido vistas na região, como o bate-bico, que apareceu em 2023 e indica que a área inundada é de boa qualidade ambiental. A partir do momento em que se parou de jogar esgoto e as margens foram preenchidas com natureza, houve uma explosão de biodiversidade. Aquilo que era uma margem estéril hoje é vida por todo canto”, celebra Moscatelli, orgulhoso em compartilhar com seus seguidores fotos de pássaros como o biguatinga, o colhereiro, o frango d’água e de animais como as capivaras que estão voltando para a área e são recepcionadas pelo macho Boris (foto abaixo).

Capivara Boris na Lagoa Rodrigo de Freitas — Foto: João Pedro Coelho - Projeto Manguezal da Lagoa

Inconformado com a sentença de que a mortandade de peixes era uma característica histórica da Lagoa Rodrigo de Freitas, ele começou a trabalhar na identificação dos problemas no local e na sua recuperação, em outubro de 1989. Moscatelli notou que das galerias pluviais escorria muito mais do que a água da chuva: vinha junto muito esgoto e óleo.

“Sabia que dava para controlar a mortandade, precisávamos de bons parceiros, comprometidos com esse objetivo. E ver a água limpa como hoje realmente foi algo muito gratificante. A Rodrigo de Freitas serve como estudo de caso prático para guiar a recuperação do sistema lagunar de Jacarepaguá e a Baía de Guanabara. São maiores, mas o contexto geral, as causas da degradação, são as mesmas”, explica o biólogo.

Transformação através do saneamento

Depois de muita denúncia das irregularidades e de 10 anos do início do Projeto Manguezal da Lagoa, surgiram os primeiros sinais de que a vida animal estava retornando. Mas, desde 2021, a regeneração deu um salto com o apoio da Águas do Rio. A nova concessionária recuperou as 13 estações elevatórias do entorno da lagoa, responsáveis por bombear para o emissário submarino todo o esgoto que poderia parar na água. O resultado prático: 5,1 milhões de litros de esgoto deixaram de ser jogados diariamente na lagoa. Além disso, a empresa realiza fiscalizações para identificar e vedar contribuições ilegais de esgoto na rede de água de chuva e passou a financiar o trabalho de Moscatelli e sua equipe, que envolve, entre outras ações, o plantio de mudas e a coleta de resíduos.

“Sem dúvida, com a melhoria permanente na qualidade da água, reflexo da efetiva gestão da questão do saneamento pela Águas do Rio, a biodiversidade explodiu positivamente”, avalia o biólogo, que hoje vê peixes como as savelhas e os robalos usufruindo da Lagoa Rodrigo de Freitas.

Manguezal é eficaz no sequestro de carbono

Se você quiser ver Moscatelli incomodado com algo é só reclamar que o “mato” está atrapalhando a visualização de uma lagoa. O mato, explica ele, é uma floresta rica e poderosa, que precisa ser preservada e ampliada.

“Os manguezais têm uma capacidade bastante expressiva de absorver contaminantes de águas poluídas, como os metais pesados, nitrogênio e fósforo. Pesquisadores também chegaram à conclusão de que eles têm uma capacidade de sequestrar, em média, quatro vezes mais carbono (um dos gases do efeito estufa que contribui para o aquecimento global) e acumular 10 vezes mais carbono que qualquer outro ecossistema, incluindo a Floresta Amazônica”, salienta o biólogo.

Não bastasse todo esse poder de funcionar como filtro, um manguezal é uma floresta com mil e uma utilidades. A biodiversidade da zona costeira entre os trópicos depende, em boa parte, dele. E, em áreas com ameaças de furacões e tsunamis, as costas protegidas por manguezais terão danos menores, pela proteção física da zona costeira que ele forma.

3 mil copos plásticos retirados em Jacarepaguá

Infelizmente, na rotina de Moscatelli não estão só os pássaros e as mudas de árvores e de vegetações que vão povoar e agir na recuperação das encostas. Há muita coleta de lixo de segunda a sexta-feira. Para se ter uma ideia, em apenas 50 metros da Lagoa de Jacarepaguá foram recolhidos 3 mil copos plásticos, durante uma semana.

Parte dos copos plásticos recolhidos na Lagoa de Jacarepaguá. — Foto: Antonia de Maria de Azevedo

“Encontro de tudo, tanto na Baía de Guanabara quanto no sistema lagunar de Jacarepaguá. Cerca de 90% é lixo doméstico, aquele saquinho plástico em que colocam tudo dentro, mas tem também pneu, sofá, poltrona, geladeira, máquina de lavar, caixa d’água. Não é uma questão de classe social, a degradação ambiental é feita por todos, seja por ação ou omissão das pessoas”, constata Moscatelli.

Para o ecólogo, a falta de políticas públicas de habitação e de saneamento básico são os principais causadores da degradação de ecossistemas tão importantes como os manguezais. Visto antes como um maluco e hoje como um visionário, ele segue acreditando na recuperação das águas e, com seu trabalho, inspirando muita gente a chegar junto e fazer a sua parte. Para o futuro, ele alerta:

“O que se esperava para 2100 está chegando agora em 2030 e, mesmo assim, muitas pessoas não acreditam nas mudanças climáticas e vivem em estado de negação. Agora temos que focar em como reduzir os danos das nossas ações com o planeta. E, uma das formas naturais para combater as consequências em zonas costeiras, é proteger e ampliar as áreas de manguezais”, defende.

Se todos fizerem a sua parte, os lagos, lagoas e baías do Rio de Janeiro onde Moscatelli e suas equipes, em parceria com a Águas do Rio, atuam protegendo o que sobrou e recuperando o que foi degradado, estarão cada vez mais despoluídos e cheios de vida vegetal e animal.

Águas do Rio

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