g1 Ouviu - Novo álbum de Billie Eilish
Aos 22 anos, Billie Eilish agora tem mais assuntos para tratar. No novo álbum "Hit Me Hard and Soft", que será lançado nesta sexta-feira (17), a cantora vai além das lamúrias e da melancolia adolescente que fizeram dela a voz (ou o murmúrio) de uma geração desenganada. Ao mesmo tempo experimental, acessível e cativante, o novo trabalho mantém Billie e Finneas -- seu irmão, produtor, coautor e fiel escudeiro -- como os nomes mais inventivos do pop americano.
Em 2019, a aparição da artista em suas roupas largas, tirando o aparelho dental e sangrando pelo nariz no clipe de "Bad Guy", estabeleceu novos parâmetros criativos e estéticos na indústria da música.
O álbum de estreia do mesmo ano, "When We All Fall Asleep, Where Do We Go?", colocou em evidência uma sonoridade entre sonho e pesadelo: um pop esquisito, cheio de distorções e cantado com voz quase sempre sussurrada. Um jeitinho que passou a ser chamado pela crítica de "whisper pop" e ganhou a adesão até de Madonna. Na moda, como era de se esperar, as peças oversized de Billie viraram a tendência da vez.
Billie Eilish em 2019 — Foto: Divulgação
Então em 2021 veio o segundo álbum, "Happier Than Ever", e ela mudou tudo. O cabelo escuro e visual carregado deram lugar a fios loiros descoloridos e uma estética suave inspirada nos anos 1950. O som incorporou referências de compositores clássicos (até de bossa nova) e os sussurros abriram espaço para novas texturas de voz. Billie trocou as letras obscuras de devaneios juvenis sobre relacionamentos explosivos, amigos tóxicos e grampear a própria língua por reflexões mais tristonhas sobre ser uma das adolescentes mais famosas do planeta.
"Hit Me Hard and Soft" mantém o tom confessional de uma artista que -- a exemplo de nomes como Taylor Swift e Ariana Grande -- controla muito bem a própria narrativa em suas músicas. Mas, no terceiro álbum, Billie Eilish adiciona contornos mais complexos à própria personalidade. "Skinny", faixa que abre o disco, é um pop rock de guitarra suave, que de cara entrega sua autorreflexão:
“As pessoas dizem que pareço feliz, só porque fiquei magra. Mas o velho eu ainda sou eu, talvez o verdadeiro eu, e acho ela bonita.”
Billie Eilish em 2021 — Foto: Divulgação
Em entrevista à revista "Rolling Stone", publicada em abril, a cantora disse que o terceiro álbum seria um retorno à sua versão do passado. “Todo esse processo foi como se eu estivesse voltando a ser a garota que eu era [em 2019]. Eu estive de luto por ela. Este não é um álbum sobre felicidade, mas há pelo menos vislumbres da experiência humana completa pela primeira vez."
Em "Lunch", pela primeira vez ela cita de forma explícita desejos e experiências sexuais. “Eu poderia comer aquela garota no almoço. Sim, ela dança na minha língua". À revista "Variety", ela falou em novembro do ano passado sobre a atração por mulheres e, depois, surpresa com a repercussão das declarações, retrucou: "Não era óbvio?".
Com batida pulsante de baixo e bateria, "Lunch" é uma das mais grudentas do álbum e pode ter o mesmo potencial de sucesso de "Bad Guy".
Uma Billie mais solar
Desta vez, porém, a atmosfera é mais solar: apesar de falar em retorno ao passado, Billie não é mais aquela adolescente apática, e no novo disco parece se apaixonar pelos processos -- bons e ruins -- de se tornar adulta.
"Hit Me Hard and Soft" segue com melodias suaves e discretas -- às vezes, discretas demais para o potencial da artista. "Chihiro" é um house agradável. "Birds of Feather" tem Billie numa performance vocal chorosa, bem diferente da habitual, e uma letra de amor que poderia ter sido escrita por Taylor Swift em outros tempos. "Wildflower" é uma balada de violão um tanto esquecível.
A atenção do ouvinte é capturada de volta em "The Greatest", história de um amor fracassado construída num dedilhado sutil, que explode no terço final em gritos raivosos e solos de guitarra. Faz lembrar da ótima faixa-título do álbum anterior, "Happier Than Ever", e incomoda um pouco a repetição do recurso. Mas o importante é que a música serve para introduzir a melhor parte do álbum.
A partir daí, "Hit Me Hard and Soft" serve o que de melhor Billie Eilish tem a oferecer: um pop maluco, deformado, distorcido e sem medo. "L'Amour de la Vie" começa como uma música de término magoada, meio Olivia Rodrigo. De repente, o vocal vira uma assustadora voz de bebê, variando entre o ameaçador e o histérico. A batida se transforma numa espécie de versão chique das músicas de coletâneas Summer Eletrohits. É o momento mais empolgante do disco.
"The Diner" tem graves tão altos que chegam a incomodar os ouvidos. "Bittersuite" usa batidas de reggae para construir uma atmosfera misteriosa e refrão que deve funcionar muito bem ao vivo. "Blue" fecha o álbum recuperando um trecho da primeira música, em que Billie se define como "um pássaro em uma gaiola".
O lamento soa como uma referência às angústias da vida de celebridade, um tema que não deixou de ser recorrente no repertório da cantora, mesmo com todas as mudanças. Ela pode se sentir presa em sua rotina de estrela precoce milionária, dona de nove estatuetas do Grammy e duas do Oscar. Mas, no que diz respeito à música pop, Billie parece ser a mais livre de todas.
Billie Eilish e Finneas posam com o prêmio de canção do ano e o prêmio de melhor canção escrita para mídia visual no Grammy 2024 — Foto: David Swanson/Reuters