Por Camila da Silva


  • Relatório final da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe de Estado em 2022 revela que Bolsonaro não assinou o decreto de golpe por falta de suporte armado.

  • Ao todo, sete militares de alta patente se opuseram ao plano. Os principais foram Freire Gomes, do Exército, e Baptista Jr., da Aeronáutica.

  • Em reuniões realizadas em dezembro de 2022, os comandantes do Exército e da FAB expressaram sua oposição ao plano golpista, com ameaças de prisão a Bolsonaro e rejeição do documento golpista.

  • Após as negativas, o grupo golpista pressionou os comandantes e descredibilizou-os nas redes sociais, chamando-os de "melancias" e coordenando ataques virtuais.

  • O relatório está na Procuradoria-Geral da República (PGR) que irá definir os próximos passos da investigação.

O ex-comandante do Exército, Marco Freire Gomes, e ex-comandante da FAB, Carlos Baptista Junior — Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O relatório final da investigação conduzida pela Polícia Federal sobre uma tentativa de golpe de Estado em 2022, arquitetada pelo entorno de Jair Bolsonaro (PL), aponta que o ex-presidente só não assinou um decreto golpista porque não conseguiu o apoio do comando do Exército, da Aeronáutica e de pelo menos outros cinco militares.

A resistência dos comandantes do Exército e da Aeronáutica impediu a consumação do ato", diz o relatório da PF.

São eles (todos à época dos fatos):

  • Marco Antônio Freire Gomes, comandante do Exército;
  • Carlos de Almeida Baptista Jr., comandante da Força Aérea Brasileira (FAB);
  • Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva, general do Comando Militar Sudeste;
  • Richard Nunes, comandante militar do Nordeste;
  • André Luís Novaes de Miranda, ex-general do Comando Militar do Leste;
  • Guido Amin Naves, chefe do Departamento de Ciência e Tecnologia da Força Terrestre;
  • Valério Stumpf, comandante do Estado-Maior do Exército.

🗓 Em 7 de dezembro de 2022, a primeira minuta foi apresentada por Bolsonaro aos comandantes do Exército, Marinha e Defesa — pouco mais de uma semana depois da derrota do ex-presidente.

Na ocasião, Freire Gomes, segundo depoimento à PF, disse que não iria dar suporte armado ao plano. O comandante do Exército ainda ameaçou prender Bolsonaro se o ex-presidente tentasse consumar o plano golpista.

General Marco Antônio Freire Gomes — Foto: Alan Santos/PR

Já o comandante da FAB, Baptista Jr. teria dito a Bolsonaro que "tais institutos não serviriam para manter o então Presidente da República no poder após 1º de janeiro de 2023", o que teria deixado Bolsonaro assustado.

Carlos de Almeida Baptista Junior — Foto: Isac Nóbrega/PR

➡ Uma semana depois, o então ministro da Defesa do governo Bolsonaro, Paulo Sérgio de Oliveira, convocou os comandantes para uma nova reunião em seu gabinete, onde voltou a apresentar o plano de golpe.

O comandante da FAB afirmou em depoimento à PF que após a apresentação perguntou ao ministro: “Esse documento prevê a não assunção do cargo pelo novo presidente eleito?”. Oliveira, então, ficou em silêncio.

Na sequência, Baptista Jr. disse "que não admitiria sequer receber o documento e que a Aeronáutica não admitiria um golpe de Estado. Em seguida, retirou-se da sala", conforme mostra o relatório do inquérito.

Ainda de acordo com o comandante da FAB, Freire Gomes também afirmou na reunião que não concordaria com a possibilidade de analisar o conteúdo da minuta.

Ataques

Após as negativas dos comandantes do Exército e da Aeronáutica, o grupo de articulação do golpe começou a pressionar os militares, já que a expectativa era de que o plano fosse consumado em 15 de dezembro de 2022.

No dia 15, Bolsonaro voltou a se reunir com os militares no Palácio da Alvorada, e Freire Gomes reforçou sua oposição a uma tentativa de golpe. Sem as tropas do Exército e da Aeronáutica, houve o recuo.

"Tal fato não gerou confiança suficiente para o grupo criminoso avançar na consumação do ato final e, por isso, o então presidente da República JAIR BOLSONARO, apesar de estar com o decreto pronto, não o assinou", diz um trecho do relatório da PF.

'Melancias'

Além das reuniões, os integrantes da organização golpista começaram a desmoralizar esses militares nas redes sociais, onde se referiam a eles como "melancias", em referência ao verde da farda e ao vermelho da fruta para ligá-los a cor do comunismo.

O responsável por coordenar os ataques virtuais era Paulo Figueiredo Filho, empresário e neto do ex-presidente João Figueiredo, do período da ditadura militar.

Segundo a PF, Figueiredo Filho divulgou em um programa de TV a chamada "Carta ao Comandante do Exército de Oficiais Superiores da Ativa e Exército Brasileiro". O documento, investigado pela PF, buscava incitar os comandantes a interferir no processo democrático.

Após a exposição do documento, o comandante do Exército passou a receber mensagens de um general da reserva, Laércio Vergílio, com pressões para aderir ao plano.

"Já sabemos quem são os “melancias”, já sabemos quem são os “nutellas” (...) Ou você toma uma decisão ou pede pra sair, é uma questão de “Foro íntimo” seu", diz um trecho da mensagem.

Além deles, de forma regional, os comandantes Richard Nunes, Valério Stumpf, Tomás Paiva, Guido Amin Naves e André Luís Novaes de Miranda, também foram expostos por se manifestarem contrários ao golpe de Estado.

Montagem de fotos com André Luis Novaes, Guido Amin Naves, Richard Nunes, Tomás Miguel Miné Ribeiro Paiva e Valério Stumpf. — Foto: Reprodução/Exército

Depois de uma conversa entre o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto e o adido da defesa Fabrício Moreira de Bastos sobre a negativa dos generais, um perfil no X publicou imagens expondo os militares contrários ao golpe.

Publicação no X em ataque aos generais que se manifestaram contrários a minuta do golpe — Foto: Reprodução

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