Por Lucas Salomão, G1 — Brasília


O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro — Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Proposto no projeto de lei anticrime apresentado pelo ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, o trecho que trata do "excludente de ilicitude" é considerado um dos pontos mais polêmicos do texto. Em análise por um grupo de trabalho na Câmara, o trecho ainda não foi colocado em votação (leia mais abaixo sobre a análise do projeto).

O termo ilicitude refere-se a algo proibido por lei, ilegal. Ou seja, há ilicitude quando a ação de um indivíduo infringe alguma lei. O chamado excludente de ilicitude elimina a punição, em casos específicos, para aquele que pratica algo que pode ser considerado ilícito.

O Código Penal brasileiro já prevê a exclusão de ilicitude em três situações: no estrito cumprimento do dever legal; em casos de legítima defesa e em estado de necessidade. O dispositivo pode ser usado por agentes de segurança e por qualquer cidadão, a depender do caso.

Quando a atuação de alguém é investigada, ele pode justificar o uso da força e citar a exclusão de ilicitude para tentar uma isenção da pena. Delegado ou o Ministério Público, então, avaliam se concordam ou não com a explicação. Se concordarem, a investigação pode ser arquivada. Se houver indícios de que o policial agiu com dolo (intenção), o Ministério Público pode fazer uma denúncia.

A proposta de Moro visa alterar o artigo 23 do Código Penal, que atualmente tem a seguinte redação:

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:

I - em estado de necessidade;

II - em legítima defesa;

III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

Excesso punível

Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

Proposta

Pela proposta do ministro da Justiça, o trecho que trata da punição de excessos cometidos por policiais em ação passaria a vigorar com mais um parágrafo, com a seguinte redação:

  • § 1º O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
  • § 2º O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção.

Ou seja, com a aprovação do texto de Moro, agentes de segurança que cometam excesso por "medo, surpresa ou violenta emoção" poderão ser isentados de punição, por exemplo, quando matarem alguém em serviço.

'Retaguarda jurídica'

Apesar de não mencionar diretamente policiais como beneficiários da proposta, a inclusão do segundo parágrafo no texto tem enfrentado resistência de parlamentares, que afirmam que o excludente pode livrar de qualquer punição policiais acusados de cometer abusos durante uma operação.

Isso porque entendem que os sentimentos de medo, surpresa ou violenta emoção são subjetivos, e poderiam acarretar em uma suposta "carta branca" para policiais matarem em serviço.

A ampliação do excludente de ilicitude é uma das principais bandeiras do presidente Jair Bolsonaro desde a campanha presidencial do ano passado. Ele defende que policiais tenham "retaguarda jurídica" durante operações, e que não podem responder judicialmente quando, por exemplo, matam em serviço.

Em fevereiro, ao justificar o trecho sobre o excludente de ilicitude, Sergio Moro disse que quem fala em "licença para matar" não leu o projeto. E afirmou que a proposta apenas define as situações específicas sobre as quais o excludente poderá ser considerado.

"O que a proposta faz é tirar dúvidas de que aquelas situações específicas descritas caracterizam legítima defesa. Então, um agente policial, que numa situação de sequestro de refém toma uma providência para prevenir a morte da vítima, é evidente que ele atua em legítima defesa. No entanto, às vezes por questões discricionárias e subjetivas de interpretação da lei, essa situação não era assim entendida. Nós apenas deixamos claro na lei, extraímos do conceito de legítima defesa situações que a ela são pertinentes. Não existe nenhuma licença para matar. Quem afirma isso está equivocado, não leu o projeto", afirmou na ocasião.

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