Parlamento da Alemanha aprova dissolução do governo do primeiro-ministro
O partido de ultradireita Alternativa para a Alemanha (AfD) anunciou que escolheu Alice Weidel como candidata ao governo para as eleições de fevereiro de 2025. Assumidamente lésbica, casada com uma imigrante e neta de um juiz nazista, Alice será a primeira mulher a concorrer ao cargo de chanceler pela legenda.
A Alemanha terá eleições antecipadas em fevereiro de 2025. Na segunda-feira (16), o Parlamento rejeitou um voto de confiança ao chanceler Olaf Scholz e optou por dissolver o governo. A votação ocorreu em um contexto de crise política. Entenda mais abaixo.
Diante desse cenário, a ultradireita apresenta como alternativa a candidatura de Alice Weidel. Atualmente, a política de 45 anos é a colíder da bancada da AfD na câmara baixa do Parlamento.
O perfil diferente da deputada tem feito com que ela se destacasse dentro do próprio partido. Em 2017, ela foi um dos nomes que ajudou a AfD a se tornar a terceira maior sigla no Parlamento.
Naquele ano, quando a Alemanha aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo, ela disse que o assunto era trivial comparado a problemas como a imigração.
Alice afirmou ainda que estava na AfD porque, segundo ela, é o único partido que aborda a hostilidade de imigrantes muçulmanos contra pessoas LGBTQIA+.
A esposa da candidata nasceu no Sri Lanka e trabalha como cineasta. As duas têm dois filhos.
Nesta reportagem você vai ver:
Avô nazista e carreira
Alice Weidel carrega flores durante coletiva de imprensa antes de ser anunciada candidata na Alemanha — Foto: REUTERS/Annegret Hilse
Alice Weidel disse que foi criada "altamente política", mesmo que os pais dela não pertencessem a nenhum partido.
O avô paterno da deputada era um importante juiz nazista, segundo o jornal "Die Welt". A família dela foi expulsa da Silésia, atual território da Polônia, após a Segunda Guerra Mundial.
Depois de cursar duas faculdades, em administração e economia, ela se juntou ao Goldman Sachs. No entanto, resolveu se mudar para a China para fazer um doutorado sobre o sistema previdenciário chinês. Enquanto isso, passou a trabalhar como consultora empresarial.
Em 2013, entrou para a política na AfD. Como colíder partidária, a deputada conseguiu trazer novos eleitores e apoios. Hans Vorlaender, cientista político da Universidade de Tecnologia de Dresden, afirmou à agência Reuters que a força de Alice está na versatilidade.
Segundo Vorlaender, Alice consegue se apresentar como uma "política burguesa moderada e bem-educada" na grande mídia. Por outro lado, alcança eleitores mais extremistas em outros meios, como nas redes sociais.
Ainda assim, analistas políticos avaliam a líder de ultradireita como alguém com um discurso mais equilibrado que outros membros da AfD. Com isso, Alice aparece para o público com um perfil mais liberal em meio a um partido que é acusado de ser antidemocrático e extremista.
Opositores, no entanto, dizem que ela é uma oportunista implacável e um "lobo em pele de cordeiro".
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Pauta de campanha
Alice Weidel, do partido alemão AfD, em setembro de 2024 — Foto: REUTERS/Liesa Johannssen
Alice Weidel afirma que a ex-premiê britânica Margaret Thatcher é sua grande inspiração. Ela também defende uma ampla reforma na União Europeia e sugeriu um referendo para deixar o bloco caso não haja mudanças.
Na economia, a candidata afirma que vai reduzir impostos, acabar com o salário mínimo e enxugar a máquina pública. Cética em relação às mudanças climáticas, Alice também promete acabar com a transição para uma economia neutra em carbono e reativar usinas nucleares e de carvão.
Uma das principais bandeiras da campanha é o combate à imigração. A líder da AfD afirma que a Alemanha vive uma "violência excessiva de imigrantes" e prometeu fechar as fronteiras.
Alice defende a deportação de "ilegais, criminosos, estupradores e assassinos", além de suspender serviços de assistência social para estrangeiros.
"Burcas, meninas com lenços na cabeça, homens portando facas que recebem benefícios do governo e outras pessoas inúteis não vão garantir nossa prosperidade", disse Weidel ao Parlamento em 2018.
Um rascunho do programa partidário da AfD apresentado dias antes da nomeação de Alice Weidel defende a saída da Alemanha da União Europeia e da Zona do Euro, além de uma política dura contra imigrantes, a reaproximação com a Rússia, restrições ao aborto e a promoção de um modelo de família tradicional.
Embora seja assumidamente lésbica, a política alemã falou que é contra a "ideologia de gênero" e disse que o Estado precisa "parar de se intrometer" na vida das pessoas por meio de políticas de diversidade.
O que dizem as pesquisas
Manifestantes seguram cartaz 'Quem vota na AfD, vota em nazistas' durante manifestação em 7 de dezembro de 2024 — Foto: REUTERS/Christian Mang
Até 13 de dezembro, um levantamento feito pelo site "Politico" apontava que a AfD tinha 19% na média das pesquisas de intenção de voto. Isso coloca o partido em segundo lugar.
Por enquanto, a liderança está com a aliança de conservadores CDU/CSU, que aparece com 32%. O partido social-democrata do atual chanceler, Olaf Scholz, está em terceiro, com 17%.
Recentemente, Alice Weidel afirmou que a AfD se tornou a segunda maior força política da Alemanha e, por isso, deveria fazer parte do governo.
Para tentar chegar ao governo, a AfD tem tentado superar um "cordão sanitário" imposto por outros membros do Parlamento da Alemanha, que se recusam a fazer alianças com o partido de ultradireita.
Atualmente, segundo a DW, a sigla está sendo monitorada pelo serviço secreto alemão por suspeita de extremismo. Isso deixou a imagem do partido com uma mancha diante da experiência histórica e traumática que a Alemanha tem com o nazismo.
Mesmo assim, as pesquisas indicam que a AfD deve ganhar mais espaço no Parlamento nas próximas eleições. Para efeitos de comparação, o partido teve 10,4% dos votos nas eleições de 2021.
Alice já reconheceu que dificilmente conseguirá chegar ao poder nas eleições de 2025. No entanto, ela acredita que terá mais chances nos próximos cinco anos.
"Os eleitores claramente querem uma coalizão de conservadores e da AfD", afirmou
Crise política
Chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, em 16 de novembro de 2024 — Foto: Tobias Schwarz/AFP
A crise política se agravou na Alemanha quando o chanceler Olaf Scholz demitiu o ministro das Finanças, Christian Lindner, que é liberal. A medida foi tomada após discordâncias sobre a política econômica.
Até então, o governo de Scholz era composto por uma coalizão entre social-democratas, ecologistas e liberais. Após a demissão do ministro das Finanças, os outros ministros liberais do governo renunciaram aos seus cargos.
Esse movimento deixou Scholz sem maioria no Parlamento e colapsou a coalizão que garantia governabilidade. Em seguida, um acordo político resultou na antecipação das eleições para fevereiro de 2025. Antes, o pleito deveria acontecer só em setembro.
Scholz também passou a ser alvo de uma moção de confiança. Já era esperado que o chanceler fosse derrotado no Parlamento, o que poderia resultar na dissolução do governo.