Recém-nascidos são levados para abrigo antibomba em hospital de Dnipro, na Ucrânia
O acolhimento era tão envolvente, que se havia algum choro no ambiente, estava abafado naquele vídeo. Eu assistia, esperando algum romper do silêncio que embalava aquelas jovens vidas, até que a imagem foi tomada pelo sorriso da enfermeira que manobrava um balão de oxigênio junto a um dos muitos corpos frágeis naquele depósito. Seria esse o rosto de uma particular felicidade de poder proporcionar, com as mãos, respiros de sobrevivência no meio de uma guerra que testa nossa sobriedade e corações?
Os recém-nascidos que estavam em UTIs neonatal de um hospital infantil em Dnipro, cidade no leste da Ucrânia, precisaram ser transferidos para um abrigo antiaéreo em um nível mais baixo do prédio nesta quinta, quando a Rússia invadiu o país. Naquele dia os ucranianos mortos - entre civis e militares - eram quase 140, e a morte vai se espalhando. Os bebês enfileirados naquele bunker subterrâneo de Dnipro se tornaram a trincheira mais poderosa da Ucrânia. Equipamentos médicos eram usados pra organizar os bebês lado a lado, com lençóis improvisados e colos resilientes de uma equipe médica armada de um imbatível instinto de proteção e afeto.
A cidade de Dnipro foi alvo de ataques com mísseis quando a invasão russa à Ucrânia começou na manhã. Aqueles profissionais não voltaram pra casa, aqueles bebês não foram para o colo dos seus pais. Quanta história já cabe naquelas trajetórias que mal começaram e já resistem à maior ignorância humana? Alguns devem ter sido extremamente desejados e planejadas, outros uma grande surpresa em forma de uma nova vida, novas possibilidades. Possibilidade de vida, de sobreposição da vida. Essas crianças venceram.
Enquanto estimula os cidadãos a se armarem contra os russos, o governo da Ucrânia também tem buscado diálogo. Mas ninguém responde. Que a trincheira dos bebês de Dnipro se fortaleça. Que a vida ucraniana resista e vença, em cada respiração que importa.